Lição de Haruji Miura: vida é breve e efêmera como a florada da cerejeira
Amigos e familiares lamentam a morte do japonês que, por cerca de 40 anos se dedicou a plantar cerejeiras no Brasil e, especialmente, em Minas
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Siga noFoi enterrado nesta quarta-feira (20/8) o japonês Haruji Miura, de 97 anos. Por cerca de 40 anos, Miura cultivou cerejeiras em Nova Lima (MG), na Região Metropolitana de Belo Horizonte. A morte foi comunicada na terça (19) pelas redes sociais da Miura Cerejeira, empresa de paisagismo localizada no Condomínio Morro do Chapéu.
De acordo com a publicação, o enterro aconteceu às 13h de hoje (20/8) no Cemitério Parque da Colina, no Bairro Nova Cintra, na Região Oeste de BH.
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Miura ficou conhecido pelo cultivo das árvores no condomínio Morro do Chapéu Golfe Clube. A Miura Cerejeira lamentou a morte e informou que ele ‘cumpriu sua missão’.
“As cerejeiras que sempre cultivou com tanto carinho e cuidado nos ensinam mais uma vez: a vida é bela, breve e efêmera! Que possamos sempre viver intensamente! Miura San, agradecemos por tudo e por nos ensinar a cultivar um dos mais belos sentimentos: a gratidão!”, diz o post.
Lição de gratidão
Haruji Miura deixou um filho, cinco netos e cinco bisnetos. O mais velho dos netos, Henrique Miura Castro, de 47 anos, recorda com carinho a trajetória do avô, nascido na década de 1920 no interior de São Paulo. Ele também tinha cidadania japonesa.
Segundo Henrique, os pais de Haruji decidiram vir para o Brasil temendo que, no Japão, os filhos fossem convocados para a guerra. Ainda jovem, Miura deixou São Paulo e se mudou para Minas Gerais, onde trabalhou na Usiminas.
Por dominar a língua japonesa, auxiliava os engenheiros que vinham do Japão para atuar na empresa de produção de aços planos. Em Minas, acabou se casando com uma mineira e fixou raízes no estado.
“Depois que se aposentou, ele não quis ficar parado. Dizia que queria fazer algo em agradecimento ao Brasil. Foi então que resolveu plantar cerejeiras, com a ajuda de um amigo que trouxe mudas do Japão”, conta o neto. Miura começou cultivando as árvores em casa e, com o tempo, passou a distribuí-las para outros estados.
Henrique descreve o avô como uma presença constante, carinhoso e muito dedicado à família. “Ele costumava dizer que as cerejeiras semeiam gratidão. Para ele, cada árvore plantada era um gesto de amor”, relembra.
O neto também guarda a lição que Miura repetia com frequência: “A florada da cerejeira é bela, mas também é breve e efêmera, assim como a vida. Por isso, precisamos viver cada momento intensamente, valorizando a beleza e a fragilidade da nossa existência”.
Festa das Cerejeiras
Além de introduzir a árvore em Minas, Haruji também realizava a tradicional Festa das Cerejeiras em Nova Lima. O evento era uma tentativa de quebrar a rotina, restaurar energias e prestigiar os participantes.
Sempre lotado, o evento continha barracas que comercializavam comidas e bebidas típicas, entre estas uma cerveja com o nome do japonês, a "Miura – Cerejeira", servida em canecões. Outras vendiam cerâmicas, louças, trajes orientais, sombrinhas e bonés fabricados no Japão. Ofereciam, ainda, shodô, arte da caligrafia, caricaturas de mangá/origami, além de mudas da árvore homenageada.
Querido, carinhoso e generoso
Angela Bahia, que trabalha no condomínio Morro do Chapéu há 15 anos, conta que é a responsável por organizar as celebrações do condomínio e relata ter sido um prazer conviver com Miura.
“O senhor Miura foi um dos primeiros moradores do condomínio, que foi fundado há mais de 65 anos. Ele era muito querido, carinhoso e generoso. Sempre expressava gratidão pelo Brasil e pelas pessoas”, conta.
Angela explica que o Hanami (costume tradicional japonês de contemplar a beleza das flores) ganhou espaço no condomínio há cinco anos. “As cerejeiras costumam dar flores em junho ou julho. E ele sempre pedia para que transformassem a contemplação em um evento”, explica.
A diretoria do condomínio apoiou a ideia e, desde então, além das flores, o Hanami é celebrado com a presença de comidas e tradições japonesas. “No Japão, costuma ser um piquenique, mas aqui adaptamos trazendo elementos da cultura, como os taikos (tambor japonês) e a culinária típica”, relembra.
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Este ano, a celebração aconteceu há cerca de um mês e, para Angela, todas as edições são sempre muito marcantes. A partir do próximo ano, mesmo sem a presença física de Miura, ela acredita que o evento perpetuará. “Os moradores apreciam muito a celebração, que é ao ar livre e reúne a comunidade de uma forma muito especial. Nós vamos manter viva a memória dele em cada festa que for realizada”.
Por fim, a organizadora lamentou a morte de Haruji. “Recebemos a notícia com muito pesar. As cerejeiras eram sua retribuição, ele dizia que queria colorir nosso país, cheio de florestas verdes”, finaliza.
*Estagiária sob supervisão do subeditor Gabriel Felice