Pilar social e religioso do Carmo, em BH, celebra 85 anos
Romaria ciclística marcada para hoje, missas e novena compõem programação de aniversário da paróquia carmelita, que se confunde com a história do bairro
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Com novenas, romaria ciclística programada para hoje e missas, a Paróquia Nossa Senhora do Carmo, uma das mais tradicionais de Belo Horizonte, celebra seus 85 anos, que se completam na quarta-feira. A programação especial começou no dia 7 e se estende até o aniversário da paróquia, conhecida por sua forte atuação em ações sociais. Fundada em 16 de julho de 1940 pela Ordem dos Carmelitas, a história da paróquia localizada no Carmo, na Região Centro-Sul da capital mineira, começa antes, com uma capelinha erguida no bairro, cujo desenvolvimento se liga diretamente à atuação dos religiosos ali, conta o frade carmelita e atual pároco, Alan Fábio Soares Lima.
Segundo ele, os carmelitas chegaram a Belo Horizonte na década de 1930, com o objetivo de construir a Igreja do Carmo. Eles foram comandados pelo frei holandês Atanásio Maatman, num trabalho que se estende à atualidade. “O frei Inocêncio Gerritsjans e, posteriormente, o frei Cláudio Van Balen e frades carmelitas que vieram da Holanda para reerguer a nossa província começaram o trabalho religioso de evangelização, de catequese, de presença fraterna e social com as obras sociais que até hoje nós mantemos”, relata o pároco.
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Essa movimentação ocorre no contexto de reconstrução da Ordem do Carmo no Brasil, iniciada nos primeiros anos do século 20, após a saída dos carmelitas portugueses. No caso de Belo Horizonte, os frades enviados pela Holanda atuaram na reconstrução da Província Carmelitana de Santo Elias, “assumindo não apenas a missão de evangelizar, mas também o compromisso social com as famílias que chegavam ao local”, explica.
A Paróquia Nossa Senhora do Carmo cresceu junto com o bairro. Quando a comunidade começou a se formar, as ruas ainda eram de terra batida. A paróquia surgiu como um ponto de acolhimento e fé. Com o tempo, se tornou referência e atraiu ainda mais moradores para a região. “Na medida em que a paróquia foi crescendo, a comunidade foi se afirmando. A paróquia conseguiu acolher novas pessoas. Vieram as grandes transformações, como a regularização da área, asfalto, energia e rede de esgoto, e o Carmo se transformou num bairro muito importante para Belo Horizonte”, conta o frei Alan.
Em 1955, com o crescimento do bairro, o então prefeito Celso Mello de Azevedo (1915-2004) ampliou a Rua Alfenas e a renomeou, fundando a Avenida Nossa Senhora do Carmo, em homenagem à padroeira e aos padres carmelitas. A entrada da igreja, que era voltava para a Rua Grão Mogol, foi transferida para a nova avenida.
Já na nova conformação, em 1966 a Paróquia de Nossa Senhora do Carmo celebrou missa da solenidade de posse de Israel Pinheiro, como governador de Minas Gerais.
TESOURO SONORO
A matriz da paróquia guarda tesouros, como um carrilhão de 37 sinos, único na capital mineira. Encomendados na década de 1940, os sinos foram fabricados na Holanda. Usados para chamar os fiéis para a missa em momentos importantes de celebrações religiosas, casa sino emite uma nota diferente. Atualmente, apenas dois estão funcionando, por meio de um sistema eletrônico que é responsável pelos badalos, e a recuperação do carrilhão é um dos desejos da paróquia.
O carrilhão foi inaugurado em 1958, e alguns dos sinos que o formam foram doados por mineiros que tiveram forte presença na política do estado e nacional, como Juscelino Kubitschek (1902-1976), José Francisco Bias Fortes (1891-1971) e José Maria Alkmin (1901-1974). No sino doado por JK há uma inscrição em que o ex-presidente oferece o instrumento aos carmelitas: “Serenissimus rei-publicae praeses Juscelino Kubitschek de Oliveira carmeliditi huic templo me obtulit” (traduzido de forma livre para “O excelentíssimo presidente da República, Juscelino Kubitschek de Oliveira oferece este sino ao templo dos carmelitas” ).
SERVIÇO À COMUNIDADE
A atração exercida sobre os políticas está, possivelmente, relacionada à força e importância da paróquia no contexto social da cidade. Desde sua fundação, a Paróquia Nossa Senhora do Carmo tem sido um importante pilar de solidariedade e serviço à comunidade. O ambulatório paroquial tornou-se referência no atendimento à população mais vulnerável, oferecendo serviços voluntários nas áreas de medicina, odontologia, psicologia e assistência social.
Além disso, a paróquia distribui cestas básicas, apoia famílias em situação de vulnerabilidade e oferece reforço escolar para crianças e jovens da região. Essas iniciativas são diretamente influenciadas pelo legado do frei Cláudio Van Balen (1933-2021), que fez grande parte da sua caminhada religiosa em Belo Horizonte, onde morreu em 2021, vítima da COVID-19, depois de dedicar mais de cinco décadas ao trabalho pastoral e social na Paróquia do Carmo. Seu exemplo de empatia e engajamento ainda inspira os paroquianos.
Nascido em 26 de setembro de 1933, na Holanda, frei Cláudio se mudou para o Brasil em 1950. Entrou para a Ordem do Carmo, aos 21 anos, em 1954. Com um grupo de jovens carmelitas, foi enviado à Paróquia de Nossa Senhora do Carmo, em Belo Horizonte, em 1967, à qual se dedicou por mais de 50 anos. A atuação do religioso foi marcada pela defesa dos pobres e de uma teologia mais inclusiva e próxima da realidade das pessoas. "Ele nos ensinou que evangelizar é também cuidar do outro", afirma frei Alan.
UMA HISTÓRIA DE SOLIDARIEDADE
O exemplo dos freis frutificou. Ao longo dos 85 anos da paróquia, centenas de voluntários ajudaram a consolidar a história, se revezando na missão de ajudar ao próximo. A aposentada Alcina Garcia de Araújo, de 88 anos, a mais antiga paroquiana, é voluntária desde os 13. “Sou a mais antiga voluntária, meus filhos sempre estão aqui também. Atualmente trabalho na catequese e no ambulatório, mas já atuei na crisma e no encontro de casais. Amo essa paróquia, ela me acolheu”, contou.
Filha da dona Alcina, Jacqueline Garcia de Araújo, de 61, é professora aposentada e também voluntária ativa na paróquia. “Nasci nessa paróquia. Aqui me batizei, crismei, sempre ajudo a paróquia de alguma forma”, conta. A atuação começou quando ela ainda era uma criança. “Lembro que tinha 9 anos, quando fiz uma leitura em uma novena de Nossa Senhora do Carmo. E não parei mais. Desde os meus 18 sou catequista na paróquia. Sou voluntária na brincadeira e fazemos apoio escolar. Dou aulas para crianças com dificuldade, não importa a matéria. Aqui para mim é uma referência de trabalho, alegria, amizade”, conta.
Maria Elizabeth Pereira da Fonseca, de 75, é moradora do Bairro Carmo-Sion há 32 anos e relata sua relação como voluntária: “Há 27 anos, abracei o voluntariado aqui na Igreja do Carmo, participo de várias pastorais e sou coordenadora no grupo de mães. Todas as segundas-feiras, em média, 50 mulheres são beneficiadas com aprendizado e aperfeiçoamento da arte do crochê, do tricô e de bordado. Fico bastante feliz quando ouço os testemunhos das beneficiadas dos nossos encontros. Esses trabalhos são vendidos em prol das obras sociais da paróquia.”
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O advogado e historiador Luiz Felipe Lisboa Quirino, de 30, fala do acolhimento que encontrou na paróquia. “Comecei a frequentar as missas esporadicamente na minha adolescência. O antigo pároco era de Outro Preto, cidade da minha família, então a gente tinha essa ligação. Em 2020, minha mãe teve um infarto severo, bem na novena de Nossa Senhora do Carmo. Nesse cenário crítico, fui acolhido. Todos rezaram bastante, pedindo pela minha mãe, que melhorou”, conta.
* Estagiária sob supervisão da subeditora Rachel Botelho