Inácio Carlos Urban foi indiciado por homicídio culposo devido à morte do então funcionário e piloto de avião Rodrigo Carlos Pereira, aos 39 anos -  (crédito: Canal Cafeteria Dulcerrado/YouTube/Reprodução)

Inácio Carlos Urban foi indiciado por homicídio culposo devido à morte do então funcionário e piloto de avião Rodrigo Carlos Pereira, aos 39 anos

crédito: Canal Cafeteria Dulcerrado/YouTube/Reprodução

A Justiça negou um pedido em habeas corpus para suspender o inquérito policial que concluiu pelo indiciamento do fundador do Grupo Farroupilha, Inácio Carlos Urban, em decorrência do crime de homicídio culposo após a morte do então funcionário e piloto Rodrigo Carlos Pereira, aos 39 anos.

 

Visando à pulverização de agrotóxicos, a vítima pilotava uma aeronave, que caiu na pista de pouso da Fazenda São Francisco, no município de Coromandel, no Alto Paranaíba, em Minas Gerais, em 2020, depois do avião receber manutenção de mecânico inabilitado contratado por Inácio.

 

 

Sob alegação de que o megaempresário do agro mineiro estaria sofrendo coação por parte da autoridade policial em Coromandel, a defesa recorreu ao Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) em 10 de junho deste ano, quando sustentou que Inácio foi “indiciado exclusivamente em razão do fato de ser proprietário da empresa para a qual Rodrigo prestava serviços” — argumentação não acolhida pela juíza da 1ª Vara Cível, Criminal e de Execuções Penais da Comarca de Coromandel, Amanda Cruz Vargas Barra, em sentença assinada na última quarta-feira (24/7). 

 

 

Para a magistrada, a documentação anexada aos autos do processo “demonstra a ocorrência do fato delituoso, além de revelar suficientes indícios de autoria”, o que é “motivo suficiente para a manutenção e o prosseguimento do inquérito”. O trancamento desse procedimento policial só é garantido no Código de Processo Penal caso falte justa causa — ou seja, quando não há indicativos mínimos de autoria e prova da materialidade.

 

A juíza lembrou que o indiciamento do empresário — proprietário da aeronave e da fazenda onde ocorreu o acidente — aconteceu após ele contratar, na ocasião, o mecânico Rogério Dalla Santa para fazer reparos no avião sem que o profissional tivesse a devida habilitação na Agência Nacional de Aviação Civil (Anac). Dalla também foi indiciado por homicídio culposo.

 

 

Logo, a magistrada acompanhou o entendimento do Ministério Público. “O empregador que não observa as cautelas necessárias para evitar acidente de trabalho pode, sim, ser responsabilizado pela prática de homicídio culposo”, disse o promotor de Justiça de Coromandel, Edon Rodarte, ao se manifestar contra o pedido de habeas corpus.

 

A reportagem entrou em contato com o Grupo Farroupilha, mas não houve retorno até o fechamento desta publicação. A defesa do mecânico Rogério Dalla Santa não foi localizada. O espaço segue aberto para manifestações.

 

Anteriormente, após o indiciamento do empresário e presidente do conglomerado ligado ao agronegócio, com sede em Patos de Minas, o departamento jurídico do grupo disse em nota que o avião caiu por “responsabilidade exclusiva do piloto”, pois o profissional não teria feito o abastecimento. Essa informação, no entanto, foi contestada pela perícia da Polícia Civil, que apontou defeitos crônicos nas bombas de combustível (leia mais abaixo). Na reportagem veiculada pelo EM em 10 de junho, o departamento jurídico alegou não ter tido “conhecimento formal” a respeito do indiciamento de Inácio, que aconteceu em abril deste ano. 

 

Queda dez minutos após decolagem

A aeronave pilotada por Rodrigo Carlos Pereira e destinada à atividade aeroagrícola estava com defeitos “gravíssimos”, como, por exemplo, superaquecimento, vazamento de óleo do motor, corte de combustível e panes elétrica e termostática, apontou o inquérito da Polícia Civil.

 

Rodrigo Carlos Pereira saiu em 7 de fevereiro de 2020 com a aeronave do aeródromo de Coromandel e caiu na cabeceira da pista de pouso da Fazenda São Francisco, perto de uma lavoura de milho, dez minutos após a decolagem. O acidente aconteceu no primeiro voo depois dos reparos feitos pelo mecânico inabilitado Rogério Dalla.

 

O piloto, apontado como “experiente” pela Polícia Civil, chegou a ser retirado com vida dos destroços, mas morreu a caminho do pronto-socorro do município. Rodrigo deixou uma mulher e dois filhos, que, à época do acidente, tinham 3 e 5 anos.

 

A Polícia Civil disse que o empresário deixou de observar a cautela necessária para evitar o acidente de trabalho, “assumindo culpa consciente ao negligenciar a contratação de um mecânico habilitado, bem como ao determinar que o piloto de sua aeronave e funcionário seguisse voando em precárias condições de segurança”. Logo, a instituição policial concluiu que Inácio explorava, em tese, de forma irregular a atividade aeroagrícola.

 

 

Defeitos crônicos nas bombas de combustível

No laudo pericial judicial apresentado nos autos de reclamação trabalhista impetrada pela família, o perito concluiu que o piloto não considerava a possibilidade de pane seca: quando o sistema não é capaz de fornecer combustível suficiente para permitir o correto funcionamento do motor. O documento revelou que o piloto solicitou o abastecimento do avião mais que suficiente para o trajeto de ida e volta.

 

Os defeitos crônicos nas bombas de combustível, bem como a posição ruim de leitura dos indicadores de nível e sua imprecisão, contribuíram para o atraso na decisão do piloto no momento de emergência, narra trecho do inquérito. Ainda de acordo com a perícia, o mecânico usou bomba não original, o que “poderia levar à perda ou consumo excessivo de combustível em voo”.