Cooperação internacional para combate das organizações criminosas em Minas
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O Sr. tem uma carreira no Ministério Público Federal construída no combate ao crime organizado, inclusive transnacional e ao terrorismo, sendo membro do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) desde 2020. A presença do crime organizado é menos sentida em Minas Gerais? Isso é uma impressão equivocada ou uma realidade? Por quê?
No âmbito do MPF, o estado de Minas Gerais foi pioneiro na implementação do Gaeco, em 2020. Como um dos integrantes do grupo, faço parte dos esforços coletivos para o combate ao crime organizado no território mineiro. O que temos percebido é que, embora Minas não seja sede das facções criminosas mais conhecidas, essas organizações definitivamente espraiaram a sua influência e atuação ao longo do estado. Em um passado recente, tivemos casos emblemáticos envolvendo tráfico de drogas, novo cangaço, terrorismo e contrabando em interseção com tráfico de pessoas, o que exemplifica a realidade multifacetada do crime organizado em Minas.
Atualmente, o crime organizado fatura mais com outros tipos de crimes, como os cibernéticos, do que com o tráfico de drogas. As forças de segurança, no Brasil, estão focadas no enfrentamento dessa nova onda de criminalidade? E em Minas Gerais? O que tem sido feito?
Os avanços tecnológicos nas empreitadas criminosas são um desafio constante. Falando especificamente como integrante do MPF, posso assegurar que há um esforço institucional no sentido de criar ferramentas e capacitar os membros e servidores para que o enfrentamento dos crimes cibernéticos ocorra com efetividade. Aqui, como em tantos outros campos, o ponto fundamental é a cooperação dentro e fora da instituição, para que os diferentes especialistas na área cibernética compartilhem conhecimento e técnicas de investigação. Ao superarem a segmentação corporativa, as forças de segurança ampliam significativamente as perspectivas de identificação de novas práticas criminosas, bem como de êxito na persecução de casos que já se encontram sob investigação.
O Sr. foi um dos vencedores do XII Prêmio República da Associação Nacional dos Procuradores da República, com um dos autores da obra sobre a “Operação Trapiche: enfrentamento ao crime transnacional e terrorismo no Brasil (Nexo Crime/Terror)”. O crime transnacional hoje é uma preocupação? De que forma as facções brasileiras estão se ramificando e o que tem sido feito para combater tal ramificação?
A Operação Trapiche chamou a atenção, inclusive em âmbito internacional, como um exemplo concreto do que chamamos de nexo crime-terror. Organizações terroristas não se limitam à prática de crimes diretamente vinculados a propósitos terroristas. Há uma ampla gama de atividades criminosas, como contrabando, lavagem de dinheiro e evasão de divisas, que podem estar relacionadas à atuação transnacional desses grupos, como de fato se verificou na Operação Trapiche. Fora isso, evidentemente, há a preocupação com as facções brasileiras também agindo fora do país. Tanto a inteligência quanto a cooperação internacional são ferramentas imprescindíveis para a desarticulação das redes estabelecidas por essas facções.
O Sr. na semana passada esteve em Lyon, França, onde fez uma apresentação para a Organização Internacional de Polícia Criminal (Interpol). A cooperação internacional para combate ao crime organizado e transnacional está sendo priorizada pelos países membros da Interpol? De que forma? Como sua apresentação se insere nesse contexto?
A Interpol organiza eventos periódicos com o objetivo de reunir autoridades policiais e profissionais do setor da justiça criminal de dezenas de países. Trata-se de uma plataforma que permite o compartilhamento de informações em nível internacional, que podem eventualmente evoluir para cooperações em casos específicos. Ao apresentar a dinâmica geral de situações que foram investigadas e processadas no Brasil, pude observar um grande interesse da comunidade internacional nos nossos achados, que acendem um alerta para a possível replicação dos mesmos modos de atuação criminosa em outros países. Da mesma forma, tomar conhecimento de certas estratégias aplicadas em investigações estrangeiras nos permite explorar novos caminhos. Sem dúvida, a cooperação internacional em seus mais diferentes níveis é crucial para a agenda institucional de combate ao crime organizado.