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Neste ano, a Resolução CNJ 345/2020, que instituiu o “processo 100% digital” e, com isso, possibilitou ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ) desenvolver o projeto “Justiça 4.0”, completa cinco anos. A iniciativa teve seu fundamento maior no próprio texto constitucional que, no inciso XXXV, do art. 5º, define que cabe ao Poder Judiciário implementar mecanismos que concretizem o princípio constitucional de amplo acesso à Justiça.
Com o advento da pandemia da COVID-19, que paralisou o mundo em 2020, o Judiciário brasileiro deu exemplo de competência naquele momento, adotando ágeis e eficientes alternativas tecnológicas que asseguraram a manutenção da tramitação dos processos através da prática de atos remotos, inclusive audiências e sessões de julgamento.
A partir daí o “juízo 100%” digital foi uma competência natural. Em outubro, ainda em meio ao isolamento provocado pela pandemia, foi editada a Resolução 345/2020 pelo CNJ, que autorizou, expressamente, a adoção do “Juízo 100% Digital” no âmbito do Poder Judiciário brasileiro. O parágrafo primeiro do art. 1º de tal Resolução já previu que, “no âmbito do Juízo 100% Digital, todos os atos processuais serão exclusivamente praticados por meio eletrônico e remoto por intermédio da rede mundial de computadores”.
A Resolução 345/2020 ressalvou o direito das partes não concordarem com a opção pelo Juízo 100% Digital, mas, ao final de quase cinco anos de vigência da referida norma, a realidade é que, na prática, o processo digital se encontra consolidado de maneira irreversível. Passo seguinte adotado pelo CNJ foi o desenvolvimento do projeto “Justiça 4.0”, que visa tornar “o sistema judiciário brasileiro mais próximo da sociedade ao disponibilizar novas tecnologias e inteligência artificial.
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Através da Resolução 385/2021 foi autorizada pelo Conselho Nacional de Justiça a criação de “Núcleos 4.0”, ou seja, núcleos “especializados em razão de uma mesma matéria e com competência sobre toda a área territorial situada dentro dos limites da jurisdição do tribunal”. No âmbito do TJMG, a Portaria Conjunta 1.338/PR/2022, instituiu o “Núcleo de Justiça 4.0 – Cooperação Judiciária” para atuar em apoio e cooperação com as unidades judiciárias no processamento e julgamento de ações, visando maior celeridade na prestação jurisdicional. O intuito que norteou a criação da “Justiça 4.0” é, pois, louvável, até porque é fundamental que se utilize da tecnologia para enfrentamento da litigiosidade do brasileiro, que fez com que 39 milhões de novas ações chegassem ao judiciário apenas em 2024. No entanto, duas premissas não podem ser ignoradas: (i) a presença obrigatória do julgador no ato de julgar, considerando as nuances e especificidades de cada processo e (ii) o resguardo da ampla defesa com os recursos a ela inerentes, conforme estabelece o art. 5º, LV, da CF/88.
Por isso, questiona-se muito avanços como o instituído pelo CNJ através da Resolução 591/2024, que confere ao relator de um processo estabelecer a sustentação oral assíncrona para os advogados das partes, ou seja, o profissional envia sua manifestação oral gravada e não mais tem a oportunidade de sustentá-la, nem mesmo virtualmente, na presença dos julgadores. De outro lado, vê-se medidas para liquidação de acervos processuais e estabelecimento de metas percentuais de admissão de recursos. Não se questiona a importância do Conselho Nacional de Justiça e o quanto medidas por ele implementadas têm sido importantes na moralização e busca da maior eficiência do Judiciário.
Da mesma forma, a Justiça 4.0 é uma necessidade. O que se espera é que, com a sua evolução, jamais a agilização seja buscada em detrimento do mais amplo direito de defesa. Este o maior desafio para o Judiciário na próxima década.