ARTES CÊNICAS

Em ‘Lady Tempestade’, Andrea Beltrão alerta para o horror da ditadura

Peça resgata a trajetória da advogada pernambucana Mércia Albuquerque Ferreira, defensora de 500 perseguidos pela ditadura militar. Ingressos estão esgotados

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Ainda que atrelado a um dos períodos mais duros da história recente do Brasil, o espetáculo “Lady Tempestade” não é apenas sobre o ontem. “A ditadura acabou, embora muitos a queiram de novo. E não só aqui, mas no mundo todo, com a extrema direita e os loucos em ascensão querendo devorar tudo”, afirma Andrea Beltrão, destacando uma de suas falas em cena: “Essas coisas acontecem, aconteceram, acontecerão”.

A atriz carioca, de 61 anos, chega hoje a Belo Horizonte para apresentar o espetáculo com sessões sábado e domingo (2 e 3/8), no Sesiminas. Com ingressos esgotados, a montagem integra o Festival Teatro em Movimento.

“Lady Tempestade” traz a público a história pouco conhecida, até recentemente, da advogada pernambucana Mércia Albuquerque Ferreira (1934-2003). Em 1964, ela viu o líder comunista Gregório Bezerra (1900-1983) sendo torturado no meio da rua no Recife. Decidiu, naquele momento, defender presos políticos. No Nordeste, atuou em cerca de 500 casos de perseguidos pelo regime militar.

O espetáculo nasceu pela mão de três mulheres: Andrea, a diretora Yara de Novaes e a dramaturga Silvia Gomez – tia e sobrinha, mineiras radicadas em São Paulo.

Yara falou com Andrea sobre um trabalho que havia feito. Era “Zé” (2024), filme de Rafael Conde sobre o líder estudantil mineiro José Carlos Novaes da Mata Machado (1946-1973), morto pelo regime militar no Recife. Durante as filmagens, ficou sabendo da história de Mércia.

Paralelamente, o potiguar Roberto Monte, militante pelos direitos humanos, preparava a edição de “Diários 1973-74 escritos por Mércia Albuquerque Ferreira” (Potiguarana, 2023). Antes de o livro ser publicado, ofereceu os originais para Yara.

Decidido o tema e a personagem, a diretora sugeriu Silvia Gomez para escrever o texto. “Não a conhecia, não sabia que era sobrinha da Yara. Li as peças dela para saber como era a cabeça. Uma autora muito doida, vi que ia dar tudo certo”, comenta a atriz.

O texto foi concebido durante um ano, entre várias conversas via Zoom. “Foi uma construção e a Silvia aceitou bem a colaboração. É muito aberta, realmente quer o melhor para o trabalho. Foi um processo muito simples, apesar do tema tão tenebroso.”

Filhos desaparecidos

“Lady Tempestade” traz a história de Mércia a partir de outra mulher. Andrea é A., que recebe os diários pelo correio. O testemunho da advogada a impacta tremendamente – por meio dos escritos de tanto tempo atrás, ela conhece a história de mulheres desesperadas com o desaparecimento dos filhos.

“É uma mulher que dedicou sua vida a essas pessoas e, ao mesmo tempo, uma pessoa comprometida com o lado bom da vida. Ela gostava de passear, conversar até as cinco da manhã, tinha a casa aberta, não deixava de fazer as unhas toda semana, pintava o cabelo de todas as cores. Era completamente solar. Ao mesmo tempo, só conseguiu viver tudo o que está no diário porque tinha paixão pela vida”, destaca Andrea.

Neste monólogo, a atriz não está sozinha em cena. Tem a companhia do primogênito Francisco Beltrão, de 30 anos.

“Um dia, Yara me perguntou o que meus filhos faziam. Falei que o Chico fazia música. Ela me pediu para conhecer, mandei algumas. Me disse que iria convidá-lo para fazer a trilha, mas que ele teria de ir a todos os ensaios. Não me meti em nada para não ficar de mamãezinha. Num belo dia, disse para ele ficar em cena. Tinha que andar, falar. O Chico entrou em pânico. Yara estava vendo anos-luz na frente. A história flecha diretamente os corações das mães e dos pais. Isso criou mais uma camada para a peça.”

O texto de Silvia foi publicado pela editora Cobogó em 2024, na coleção “Dramaturgia”. Andrea destaca uma parte. “Mércia morreu depois de sete paradas cardíacas. Sentia muitas dores no peito e a Silvia, lindamente, escreveu: ‘Tenho uma falésia, uma falésia no meu peito que não para de doer’. É lindo, pois cria a imagem concreta do que a gente sente quando tem uma angústia”, comenta.

Teatro Poeira

Fundado por Andrea Beltrão e Marieta Severo em Botafogo, Zona Sul do Rio, o Teatro Poeira está completando 20 anos. “É uma realização enorme, a gente nunca imaginou que fosse capaz de ir tão longe”, conta Andrea.

O teatro como espaço de espetáculos é bem ocupado, mas as atividades paralelas, como cursos, sofrem com a falta de patrocínio.

“Procuramos mais de 50 empresas e a resposta é sempre delicada: ‘O projeto é maravilhoso, boa sorte, mas um teatro não é nossa estratégia nesse momento’. Transformamos agora o teatro em Organização Social (OS) para receber ajuda mais efetiva e lutar para sair da invisibilidade”, diz Andrea Beltrão.

“LADY TEMPESTADE”

Sábado (2/8), às 20h, e domingo (3/8), às 19h, no Teatro Sesiminas (Rua Padre Marinho, 60, Santa Efigênia). Ingressos esgotados.

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