Disco da cantora Nádia Campos louva a Mantiqueira e as raízes do Brasil
Com sete faixas, álbum destaca violas e violões, celebra o legado do artista baiano João Bá, homenageia os povos originários e a cultura popular
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Siga noA cantora, compositora e multi-instrumentista belo-horizontina Nádia Campos segue sua jornada de encantamento pela arte e lança o quarto álbum, “Mantiqueira”, marcado pela colaboração com diversos parceiros.
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A voz grave e delicada da artista se soma a refinados arranjos de violas caipiras e violões para louvar uma das mais belas regiões do Brasil, onde montanhas, matas, cachoeiras e culturas ancestrais compõem mosaico ao mesmo tempo íntimo e festivo.
“Vivi 10 anos no Sul de Minas. Lá, meus filhos passaram toda a primeira infância e parte da segunda”, conta a artista. “As águas da Mantiqueira são maravilhosas! Cachoeiras, águas sulfurosas e medicinais. As folias de reis, a cultura caipira, a memória apagada dos puris – cantar essas belezas e tesouros é evocar e agradecer o colo de mãe da Amantikir, Mantiqueira, serra que chora”, diz.
Em sete faixas e 30 minutos de melodias elegantemente singelas, o álbum apresenta Nádia Campos capitaneando um time de primeira linha para revelar belezas acústicas emocionantes.
Lenda
A abertura vem com a narração de uma breve lenda sobre a origem da Serra da Mantiqueira – contar histórias poéticas é um dos talentos da cantora. A viola e a voz de Levi Ramiro se juntam a Nádia para desenhar o cenário tenro e paradisíaco.
“Emoção gerando prantos, são os rios corredeiras. São seus olhos, lindos olhos, da serra que goteja, seguindo no seu caminho para encontrar com o velho mar”, diz um trecho da composição assinada também por João Bá.
Célebre artista do sertão baiano morto em 2019, aos 87 anos, Bá é dono de rica trajetória na cultura popular brasileira, construída com independência e criatividade em meio à ditadura militar, influenciando várias gerações.
“João Bá foi um grande amigo e mestre, entusiasmado com a música, com as artes. Amava o Brasil, a natureza. Trazia olhar sensível em uma linguagem universal, sem se desconectar das raízes no sertão baiano. Tive a bênção de conviver com ele intensamente nos últimos anos de vida”, conta Nádia.
Na faixa “Bacurau traquina”, o cantor e violeiro João Arruda resgatou gravação inédita da voz de João Bá e a inseriu na composição: o resultado é de arrepiar.
“Não tive como não me emocionar com esse presente, com essa presença. Representa o que João Bá sempre quis: que a música dele fosse livre, que se espalhasse pelo mundo”, afirma a cantora.
O espírito desbravador de Nádia estabelece conexões para além da Serra da Mantiqueira. O resgate da memória do sertanejo baiano João Bá é apenas o primeiro exemplo.
Há também menção à cantora e arte-educadora Doroty Marques, atuante na cultura brasileira desde a década de 1960 e autora da faixa “Origens”. Ela mora em Alto Paraíso (GO), onde desenvolve trabalho de iniciação artística voltado a crianças e adolescentes.
Guerreira
“Doroty é uma amiga, guerreira que atravessou a ditadura militar, as pressões do mercado fonográfico brasileiro, a política imperialista que visava massificar a sociedade e apagar as identidades. É uma grande inspiração por defender o fazer artístico autêntico, multiplicado através da arte-educação”, afirma Nádia.
“Cantar 'Origens' é, de alguma maneira, homenagear Doroty e os povos originários do nosso território, cujos saberes vêm sendo violentamente apagados. Trazer à tona palavras originárias e seus significados é tentar não deixar essa memória se apagar”, prossegue.
Outros convidados são o paraense Bené Fonteles, autor de “Por um fio”, e o fluminense Luís Perequê, que assina a comovente “Sempre viva”.
Antes de produzir “Mantiqueira”, Nádia se envolveu em projetos ligados a temáticas latino-americanas. Primeiro, lançou o videoclipe “Fluxo”, em parceria com o violonista peruano Gaddafi Núñez. No curta “América Latina entrelaçada – Residência artística”, revela parte da intimidade de seu processo criativo e apresenta o Estúdio VentaMoinho, em Pocinhos do Rio Verde, no Sul de Minas, onde gravou o novo trabalho.
Nádia também dirigiu e roteirizou o vídeo “Brasileira e latino-americana”, fruto de 20 anos de pesquisa. “Ele busca, de maneira subjetiva, responder à pergunta com a qual me deparo constantemente: como ser tão conectada com minhas raízes mineiras e ao mesmo tempo gostar tanto de interpretar ritmos e canções de outros países da América Latina?”, comenta. Em breve, ele será disponibilizado no canal da cantora no YouTube.