
Ao humano, a Imaginação. À IA, a Alucinação
Quando a criatividade humana encontra a tecnologia, ética e verdade se tornam essenciais para que as boas ideias se sustentem de pé
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Na última semana, participei de um evento muito interessante promovido pela Adriana Machado, diretora da Tom Comunicação. Ela compartilhou os principais insights que trouxe do Festival Internacional de Criatividade de Cannes, considerado o Olimpo dos publicitários, onde todos sonham em conquistar um cobiçado Leão. Em uma indústria que movimenta cifras astronômicas, esses prêmios valem mais do que ouro. Porém, em tempos de inteligência artificial como co-piloto dos criativos, o clima fechou na cidade francesa.
Imaginação humana versus alucinação artificial
A grande diferença entre humanos e máquinas está na capacidade única de imaginar. A imaginação é um salto criativo, um ato de liberdade. Já a IA frequentemente confunde criatividade com alucinação, entregando respostas plausíveis, mas nem sempre verdadeiras. Isso nos obriga a ficar muito atentos e a assumir ainda mais nossa responsabilidade na apuração e na divulgação de informações.
Só que a publicidade é uma indústria ansiosa. E isso faz com que o desejo de ganhar prêmios, por vezes, se sobreponha à construção de soluções reais para os desafios das marcas. O processo criativo genuíno nasce da identificação de um problema, seguido pelo espaço para imaginar e só então propor caminhos possíveis.
Os melhores cases navegam pelo caminho da inovação, com identificação de dores, formulação de hipóteses, testes e validação. Não basta mais uma jogadinha publicitária isolada. É preciso entender profundamente o negócio do cliente para propor algo realmente relevante.
Crise ética materializada: IA e manipulação no centro do debate
Muitas vezes, a pressa por reconhecimento atropela o tempo necessário para validar hipóteses, escalar soluções e colher resultados reais. Inovação de verdade leva tempo.
A crise ética da publicidade ganhou contornos concretos em Cannes, quando uma renomada agência brasileira inscreveu um case no festival com informações manipuladas por inteligência artificial. O videocase apresentava resultados e situações simuladas, incluindo edições de matéria jornalística, de palestra internacional e o uso de narração sintética para dar mais veracidade à campanha. A manipulação foi descoberta após a premiação, levando à cassação de prêmio e ao rompimento do contrato entre agência e anunciante.
O escândalo reacendeu o debate sobre ética, transparência e credibilidade na publicidade, especialmente diante do avanço da tecnologia e da facilidade de manipulação de conteúdos.
A confiança, valor inegociável para a indústria criativa, ficou abalada. O festival reforçou seus mecanismos de governança para o próximo ano e ressaltou que a busca por prêmios não pode se sobrepor à integridade dos trabalhos apresentados.
O valor da perenidade: o caso Dove
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Mas, felizmente, o festival não teve só escândalo. Um destaque positivo é a perenidade do conceito “Real Beleza” da Dove, criado em 2004 e fortíssimo até hoje. São mais de 20 anos de jornada com a mesma plataforma de comunicação, premiada mais uma vez em Cannes, agora com um case que propõe soluções reais para representar a beleza autêntica em tempos de algoritmos de IA enviesados. Aqui, espírito do tempo e imaginação convergiram lindamente.
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O segredo está em acreditar na perenidade. Executivos e criativos precisam ser consistentes e abraçar a continuidade das plataformas das marcas em vez de se seduzir pela autoria solitária e a reinvenção constante. Assim, marca e agência podem fluir juntas em um ciclo virtuoso.
Como bem definiu Adriana Machado, é admirável a disciplina estratégica de marcas extraordinárias. E talvez esse seja o maior prêmio: imaginar, realizar e resistir ao tempo, algo que, por enquanto, só a imaginação humana é capaz de entregar. E com resultados reais e impactantes, deixando a alucinação apenas para as máquinas.
As opiniões expressas neste texto são de responsabilidade exclusiva do(a) autor(a) e não refletem, necessariamente, o posicionamento e a visão do Estado de Minas sobre o tema.