
Um tributo a Juliana e a todos que partiram vivendo
Não importa onde a vida termina, mas sim como nós escolhemos vivê-la
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Creio haver um significado mais profundo na morte daquelas pessoas que partem dessa vida enquanto estão tendo uma aventura. Obviamente que há tristeza - e tem como não haver? – pois toda vida humana é irrepetível e singular, e a sua extinção, ainda mais quando ocorre de modo abrupto, sempre carrega um peso que atravessa os que ficam. Mas, junto à tristeza, sinto uma profunda admiração por pessoas que a morte encontra em pleno gozo da vida, ocupados em vivê-la e não apenas em existirem.
Sempre penso que essas pessoas poderiam, como a maioria de nós, escolher o sofá, as viagens seguras ou os passeios previstos nos pacotes de turismo tradicionais. Mas não, elas encontram a morte querendo ir além, desafiando os próprios limites, saindo dos contornos seguros, para se reafirmarem enquanto senhores de si mesmos. E talvez exista uma beleza secreta, travestida de lição, escondida nesse tipo de partida: a compreensão de que viver é uma experiência arriscada, mas sempre ativa, nunca um estado de espera.
Não estou advogando que exista algo de heroico em desafiar a vida inconsequentemente, e não foi o que aconteceu com a publicitária Juliana Marins ou com as vítimas do balão em Santa Catarina. O que há nessas histórias não é um flerte com a temeridade, mas uma decisão de não se render à anestesia existencial dos dias previsíveis. Ao contrário do que li em alguns posts de redes sociais, essas pessoas não estavam brincando com a morte, elas estavam profundamente comprometidas com a vida, mas não com qualquer vida, e sim com uma vida que elas consideravam digna de ser vivida.
Camus dizia que o absurdo da vida não nos autoriza a desistir dela, ao contrário, nos convoca a participar dela com mais coragem e entusiasmo, mesmo sem garantias, mesmo diante dos riscos, mesmo diante da possibilidade da finitude nos encontrar em qualquer esquina. E é exatamente o que essas pessoas que perderam a vida em suas aventuras nos mostram: que não se trata de procurar a morte, mas de ter coragem para estar inteiramente vivo quando ela chegar, porque ela necessariamente vai chegar.
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Elas nos mostram que o risco não é a morte física em si, mas a possibilidade de já estarmos mortos de alma quando ela chegar. Fugir dos riscos pode parecer mais prudente, mas, às vezes, é apenas um modo disfarçado de desistirmos de nós mesmos. Há quem passe a vida toda preservando o corpo, mas se esquecendo de que viver é algo que exige de nós coragem para assumirmos os riscos necessários rumo àquilo que nos parecer essencial em nossas vidas. A morte não nos chega apenas numa montanha na Indonésia ou num voo de balão, ela acontece na estrada, na rua, no sofá, no avião, caminhando pela rua... e nossa tarefa é termos a certeza de estarmos despertos e em plena atividade quando ela nos encontrar.
Somos educados para pensarmos que a grande tarefa do ser humano é fazer com que nossas vidas tenham duração longa, mas nunca nos ensinam que é preciso que a vida também pulse dentro de nós. E não há vida que pulse sem a assunção de alguns riscos, eles são o preço a ser pago por uma vida que verdadeiramente nos pertence.
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Não importa o tipo de risco que estamos falando, pois nem todos desejarão escalar montanhas ou andar de balões, mas certamente a aventura da qual me refiro pode se referir ao fechamento de um ciclo, a decisão de amar novamente ou mudar de cidade ou profissão, não interessa, o tipo de risco que queremos assumir, mas uma boa vida necessariamente é um convite constante ao risco. Nas montanhas do Himalaia, na Indonésia ou nos céus de Santa Catarina, que essas vítimas sigam nos ensinado que não importa onde a vida termina, mas sim como nós escolhemos vivê-la.
As opiniões expressas neste texto são de responsabilidade exclusiva do(a) autor(a) e não refletem, necessariamente, o posicionamento e a visão do Estado de Minas sobre o tema.