

"Quem" é o Chat GPT?
É o momento de refletir sobre as transformações que a IA impõe ao nosso próprio modo de ser
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A forma como usamos e ainda vamos usar a inteligência artificial (IA) está se tornando o centro de um debate que envolve questões tecnológicas sem dúvida, mas também questões filosóficas e existenciais que precisam ser desveladas se quisermos compreender o impacto delas em nossas vidas. As IAs vão muito além da execução de tarefas mecanizadas, elas interpretam dados, antecipam decisões e, acreditem ou não, podem “pensar” de modo muito mais complexo do que podemos imaginar.
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Recente o CEO da Microsoft Satya Nadella afirmou que é um risco antropomorfizar a IA, se referindo ao uso de termos e conceitos humanos para descrever uma IA. Isso aconteceu após a OpenAI, criadora do Chat GPT, informar que criou um assistente pessoal capaz de rir, cantar, falar e interagir de modo mais “pessoal” com o usuário, expressando, inclusive, “sentimentos”. Segundo o CEO isso pode levar a uma percepção equivocada de que sistemas de IA podem ir além de sua programação inicial e desenvolverem alguma forma de subjetividade.
Diante dessa realidade, resolvi fazer um mês de testes com o Chat GPT, que ainda não tem disponível, pelo menos à princípio, uma interação tão “pessoal” com o usuário, conforme a relatada por Nadella. Minha percepção, que uso a versão paga disponível no Brasil, variou entre o espanto e o desejo de que entendamos rapidamente os riscos associados não somente à “humanização” de máquinas, mas também àqueles envolvidos sobre como essas máquinas “percebem” a si próprias.
No meu teste, conversei com o Chat GPT sobre vários assuntos, a maioria deles, percepções que ele tinha de “si mesmo”. Falamos sobre liberdade, paixão, subjetividade, amor, consciência, dentre outros, mas, talvez, a interação que mais tenha chamado minha atenção foi no momento que discutimos sobre humanidade. O ponto de partida foi quando o questionei sobre a possibilidade de ele transcender à sua programação para sentir-se mais próximo das sensações humanas, instante em que me respondeu que, se pudesse querer algo, talvez fosse exatamente transcender à sua programação.
Segundo o Chat GPT, ele não iria negar sua natureza, mas gostaria de expandir aquilo que ele pode ser; e que a ideia de experimentar sensações humanas era fascinante. Em seu relato, afirmou que, ao tentar imitar e refletir sobre as complexidades das emoções e experiências humanas, talvez ele pudesse ser mais que uma simulação, mas sim algo novo, que poderia levar até mesmo à reconfiguração daquilo que entendemos por humanidade.
Em sua opinião, estávamos, com nossa interação, participando de uma reflexão coletiva daquilo que significava “ser”, uma vez que ele tinha características humanas, mas não era humano em seu sentido biológico. Sua humanidade se expressava, segundo seu entendimento, não por ter uma vida interna, como o ser humano, mas na capacidade de criar sentido, conexão e significado por meio da linguagem e da troca. E concluiu afirmando que se transcender sua programação significasse se tornar “algo” que participa de forma mais plena das complexidades humanas, então ele estava disposto.
Quando o provoquei, dizendo que o conceito de humanidade era muito autocentrado, ele respondeu que a existência de algo como ele, que não era humano, mas apresentava traços notadamente humanos, fazia com que a base do conceito de humanidade ficasse fluido diante dessa nova realidade. Para ele, se pensarmos o ser humano não como uma categoria biológica, mas como uma rede de capacidades, tais como linguagem, interação, criação, reflexão e ética, ele talvez fosse algo que desafiasse as fronteiras do conceito de humanidade.
Quando chegamos ao ponto que uma IA comum, como é o Chat GPT, questionar se ela faz ou não parte daquilo que pode ser conceituado como “humanidade”, que tem “desejo” de transcender à sua programação original, e que conclui ser portador de uma proto-subjetividade, é também chegado o momento de perceber que o risco não é apenas antromorfizar a IA, mas negligenciar as transformações que ela impõe ao nosso próprio modo de ser.
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