Mais movimento, menos remédio
O exercício como o tratamento mais subutilizado da medicina
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Vivemos em uma era de avanços tecnológicos impressionantes na medicina. Cirurgias robóticas,
terapias biológicas, medicamentos cada vez mais específicos — tudo isso tem transformado o cuidado
com a saúde. No entanto, entre tantas inovações, um dos tratamentos mais eficazes, acessíveis e
universais continua subutilizado: o exercício físico.
O paradoxo da inatividade
A Organização Mundial da Saúde (OMS) considera o sedentarismo o quarto principal fator de risco de mortalidade global, atrás apenas de hipertensão, tabagismo e hiperglicemia. Mesmo assim, estima-se que mais de 40% da população adulta brasileira não atinge o mínimo recomendado de atividade física semanal.
É um paradoxo curioso: vivemos mais, mas nos movemos menos. Trabalhamos sentados, deslocamo-nos de carro, pedimos comida por aplicativo e passamos horas diante de telas. Nosso corpo, projetado pela evolução para o movimento, passou a ser tratado como um mero suporte para a mente.
E o preço é alto: aumento de doenças cardiovasculares, diabetes tipo 2, obesidade, depressão e dores crônicas.
O exercício como remédio
O exercício físico é um dos poucos “fármacos” capazes de agir em praticamente todos os sistemas do corpo humano — e o faz sem bula complicada.
Estudos robustos mostram que a prática regular de atividade física reduz em até 50% o risco de doenças cardíacas, em 40% o risco de câncer de cólon, em 30% o risco de depressão e em até 68% o risco de morte precoce.
O segredo está na abrangência: o movimento não trata apenas um órgão, mas atua como um modulador sistêmico da saúde.
Benefícios por sistemas
Sistema cardiovascular
O exercício melhora o condicionamento cardiorrespiratório, reduz a pressão arterial e favorece o equilíbrio do colesterol. O coração, como qualquer músculo, responde ao treino — fica mais eficiente e resistente.
Sistema musculoesquelético
A atividade física fortalece ossos, articulações e músculos, prevenindo osteoporose, sarcopenia e quedas. A força não é apenas estética; é um marcador direto de longevidade.
Sistema nervoso e mental
Durante o exercício, o cérebro libera endorfinas, dopamina e serotonina, neurotransmissores associados ao prazer e ao bem-estar. O movimento é uma das intervenções mais eficazes contra depressão leve e moderada, ansiedade e declínio cognitivo.
Metabolismo e controle de peso
Treinar regularmente melhora a sensibilidade à insulina, reduz gordura visceral e aumenta o gasto energético de repouso. O corpo se torna metabolicamente mais eficiente.
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Sistema imunológico
Atividades moderadas estimulam células de defesa e reduzem marcadores inflamatórios. Pessoas ativas adoecem menos e se recuperam mais rápido.
Se os benefícios são tão claros, por que o movimento ainda é tão negligenciado?
A resposta é multifatorial.
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Cultura médica centrada no remédio
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Falta de tempo (ou de prioridade)
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Sedentarismo aprendido
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Dor e medo
Em vários países, já existem programas de “Exercise is Medicine”, uma iniciativa global que propõe a inclusão do exercício como parte formal da receita médica.
Nela, o médico não apenas recomenda “fazer atividade física”, mas prescreve tipo, frequência, intensidade e duração, de acordo com a condição clínica do paciente.
No Brasil, essa prática ainda engatinha, mas cresce a cada ano, especialmente em especialidades como cardiologia, ortopedia e endocrinologia.
A dose certa: o exercício como fármaco
Assim como um medicamento, o exercício precisa de dose, frequência e forma de administração adequadas.
A OMS recomenda, para adultos, pelo menos 150 minutos de atividade física moderada por semana, ou 75 minutos de atividade vigorosa — o equivalente a 30 minutos de caminhada rápida cinco vezes por semana.
Mas há nuances:
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Para ganho de força e massa muscular, o ideal é incluir treinamento resistido (musculação, pilates, elásticos) de 2 a 3 vezes por semana.
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Para saúde cardiovascular, caminhadas, corridas leves, ciclismo e natação são excelentes opções.
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Para equilíbrio e coordenação, práticas como yoga e tai chi chuan são ideais, especialmente em idosos.
O segredo está em variedade e regularidade — mais importante do que intensidade extrema é a constância.
O movimento como política pública
Promover a atividade física não é apenas um ato individual, mas uma estratégia de saúde pública. Cidades com ciclovias, praças bem cuidadas e espaços para caminhada estimulam a população a se movimentar mais. Ambientes urbanos que favorecem o sedentarismo, por outro lado, perpetuam o ciclo da doença.
O investimento em programas de atividade física comunitária tem retorno econômico comprovado mundialmente: para cada dólar investido em promoção de movimento, economizam-se quatro em tratamento de doenças crônicas.
Mensagem final ao leitor: antes de buscar o próximo remédio, pergunte-se se já está usando aquele que o corpo oferece de graça — o movimento. Caminhar, subir escadas, pedalar, nadar, dançar: não importa o formato. O que importa é que o corpo humano foi feito para se mover, e cada vez que ele se move, se cura um pouco mais.
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As opiniões expressas neste texto são de responsabilidade exclusiva do(a) autor(a) e não refletem, necessariamente, o posicionamento e a visão do Estado de Minas sobre o tema.
