Renato Quintino
Renato Quintino
O chef Renato Quintino tem formação como filósofo e artista plástico, é professor de gastronomia e vinhos no Espaço Renato Quintino, autor do livro "A Invasão dos Incas Venusianos - Receitas de Todos os Mundos" e guia em viagens internacionais focadas em
COMIDA, DIVERSÃO E ARTE

Os 40 restaurantes onde não vou

Não se trata só de cozinhar bem. Embora os jurados sejam, teoricamente, anônimos há uma rede paralela de espionagem que os identifica

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Um amigo me disse outro dia ter estudado a lista do 50 melhores restaurantes do mundo, que foi revelada há três semanas. Contemplou que não vendem mais comida e sim “experiências”. E como ele se intitula “menino criado com vó” e que teria paladar infantil, após analisar o cardápio de cada um dos 50 melhores restaurantes do mundo, ele fez a lista dos 40 onde ele nunca irá.

 

 

Foi engraçado o comentário. Ao mesmo tempo em que listas como esta atraem “foodies” de todo o mundo, afasta também muita gente que quer comida que pareça comida: um belo prato de pasta, uma carne grelhada, um peixe dourado com um toque de azeite e ervas, um fumegante e aromático frango assado.

 

No lado positivo, esta lista tirou a hegemonia do Guia Michelin, que teve que se reinventar avaliando restaurantes fora da França. O 50 Best colocou países como o Brasil, a Rússia, a Dinamarca, a Espanha, a Nova Zelândia, a Argentina e os EUA no mapa. Estimulou o turismo gastronômico e a gastronomia como expressão local. Quanto mais regional for a experiência, mais pontos e chance de estar na lista existem.

 

 

Mas não se trata só de cozinhar bem. Embora os jurados sejam, teoricamente, anônimos há uma rede paralela de espionagem que os identifica. Aí vêm convites para viajar com tudo pago para conhecer a experiência oferecida por restaurantes em vários países. Tudo muito discreto, o restaurante não menciona que descobriu o jurado e este finge estar ali porque foi convidado por um motivo enigmático. O voto não é garantido. Não estou criticando o lobby, é assim que as coisas funcionam. Não basta um filme ser bom para ganhar o Oscar, há toda uma maratona de jantares, viagens, seções exclusivas para convidados etc.

 

É conhecido que estar na lista faz com que entre muito dinheiro para os restaurantes. Mas, como tudo tem dois lados, uma vez fora da lista, a casa fecha também. Lidar como este vai e vem e manter o pé no chão é uma característica de empreendedores conscientes que resistem à vaidade das premiações. É conhecida a “maldição do Oscar”, na qual, após ganhar o prêmio, a carreira do ator empaca, não haveria mais nada a ser alcançado. O “what’s next?” é sempre uma pressão e alguns sucumbem em depressão, no ostracismo ou em coisa pior.

 

A verdade é que, se de um lado existem, teoricamente, os 50 melhores - já estive em vários deles, alguns são de fato “experiências” emocionantes -, existem outras centenas de restaurantes pelo mundo onde se serve comida deliciosa, com ambiente acolhedor e animado, com serviço simpático e com preços ótimos.

 

 

Escrevi no passado um artigo chamado “Quatro Pratos e um Funeral”, que falava do clima tenso e solene de muitos destes restaurantes. Quando o prato chega na mesa, é um acontecimento, há um silêncio sepulcral, até crianças ficam reverentes diante da pedra que chegou comum “bite” ou do arbusto com uma bolinha comestível dentro que explodirá na boca.

 

“Em casas como estas o momento é o do restaurante, não o seu”, disseb em uma amiga que avalia restaurantes: interrompem a nossa conversa todo o tempo para explicar cada detalhe do prato e o vinho escolhido. Já ouvi também o comentário sobre muitos dos menus: “achei tudo muito interessante, mas não tenho vontade de comer nada”.

 

 

Francis Mallmann criticou a lista há alguns anos, falou que não concordava com a gastronomia vista desta forma e que não seria mais nem mesmo jurado. Alex Atala, quando estava entre os cinco melhores, disse que “toda lista é injusta, se você não está nela”. Não era o caso de Mallmann, que sempre esteve.

 

As opiniões expressas neste texto são de responsabilidade exclusiva do(a) autor(a) e não refletem, necessariamente, o posicionamento e a visão do Estado de Minas sobre o tema.

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