
Para atacar o cerne da questão
O grande desafio fiscal do governo é equilibrar a balança por intermédio do controle das despesas obrigatórias, especialmente as previdenciárias
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Enquanto o nosso país debate como fará para se adaptar à famigerada tarifa aduaneira média que nos foi imposta pela nação provavelmente mais rica do mundo, sob o comando da figura, no mínimo, super polêmica, me posiciono do lado dos que, em que pese isso, acham que a caótica situação fiscal do Brasil é o problema número um que temos de enfrentar por aqui. Dito de outra forma, é o que precisa ser rapidamente diagnosticado e, ao final, equacionado. Nesse contexto, agradeço a ajuda crucial do especialista Leonardo Rolim, ex-secretário de Previdência na gestão de Jair Bolsonaro (PL).
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Para tentar equilibrar as contas públicas, no dia 11 de junho deste ano, o governo federal havia editado a Medida Provisória nº 1.303, após a reação negativa do Congresso e de alguns setores produtivos a dois decretos presidenciais publicados em maio (12.466/25 e 12.467/25), que aumentavam o IOF. Esperava-se que eles tivessem um foco firme na redução dos gastos públicos, algo que não ocorreu.
Todos os que acompanham de perto as contas públicas sabem, hoje, que o grande desafio fiscal do governo é equilibrar a balança por intermédio do controle das despesas obrigatórias, especialmente as previdenciárias, que representam, somando o Benefício de Prestação Continuada (BPC), não menos que cerca de 58,5% das despesas primárias da União.
Diante disso, havia uma grande expectativa de que essa medida provisória trouxesse alterações nas regras previdenciárias para, de fato, controlar o crescimento da despesa. É muito difícil imaginar que a despesa previdenciária iria cair sozinha, exatamente quando estamos passando por um rápido processo de envelhecimento, o que aumenta o número de aposentados.
A não ser que, se houver uma melhor gestão previdenciária, seja possível conter as fraudes, que sempre foram um problema sério na Previdência. Porém, nos últimos anos, com a evolução das fraudes cibernéticas, ganhou uma dimensão muito maior. O TCU já informou que cerca de 11% das despesas previdenciárias são indevidas.
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Isso representa, pasmem, cerca de R$ 110 bilhões de reais apenas em 2025, em projeção. Se considerarmos que metade desse valor poderia efetivamente ser economizado se o Ministério da Previdência e o INSS fizessem o que manda a lei, teríamos uma economia de cerca de R$ 55 bilhões.
Apenas para ter uma ordem de grandeza, conforme informado pela imprensa, existem cerca de um milhão de processos no sistema de Monitoramento Operacional de Benefícios (MOB). Historicamente, cerca de 55% desses processos levam à cessação do respectivo benefício. Isso significa dizer que estamos pagando todo mês cerca de 550 mil benefícios indevidos. Fazendo uma “conta de padaria”, são cerca de 14 bilhões por ano que estão saindo pelo ralo pela falta de capacidade ou prioridade do INSS em combater as fraudes.
Esse é apenas um de muitos exemplos. Outro é a necessidade de revisão a cada dois anos do BPC da pessoa com deficiência. Todavia, a última vez que isso ocorreu foi em 2009. Juntando a falta de revisão do BPC com as fraudes cibernéticas, verificou-se nos últimos anos um alarmante crescimento nos gastos com tal benefício. O mesmo ocorreu com a previdência rural e com o Seguro Defeso.
Porém, o caso mais sério é talvez o aumento das despesas com o auxílio por incapacidade temporária, o antigo auxílio-doença. Nesse caso, há uma responsabilidade mais direta do Ministério da Previdência Social e do INSS, pois esse crescimento deveu-se a uma invenção fora de propósito, em setembro de 2023, do chamado Atestmed. Com essa medida, qualquer fraudador simula um atestado médico no seu computador ou celular, manda para o INSS e recebe o benefício sem ter que fazer perícia, nem precisar confirmar a veracidade do atestado.
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A justificativa inicial do Atestmed era, pasmem, a redução das despesas com a fila do INSS. Qualquer um sabe que aconteceria exatamente o oposto. Iria ampliar imensamente o número de requerimentos, as despesas do INSS e, consequentemente, as filas. Dito e feito. O impacto do Atestmed, desde a sua implantação, deve chegar a uma ampliação de despesa na ordem de pelo menos R$ 30 bilhões.
Na MP 1.303, o governo federal finalmente reconheceu que o Atestmed foi um erro e que causa mais despesa. Todavia tenha feito o diagnóstico certo, porém com a medicação errada. Ao invés de acabar ou remodelar completamente o Atestmed para evitar as fraudes, simplesmente reduziu seu prazo de duração para 30 dias. Isso vai diminuir o desperdício de dinheiro público, mas não vai acabar com as fraudes. Por outro lado, vai criar um retrabalho imenso para o INSS, que já está com a maior fila da história e ainda com o abacaxi de resolver o escândalo dos descontos associativos.
As opiniões expressas neste texto são de responsabilidade exclusiva do(a) autor(a) e não refletem, necessariamente, o posicionamento e a visão do Estado de Minas sobre o tema.