Paulo Rabello de Castro
Paulo Rabello De Castro

O Capital do Futuro é Verde

Poupar o ambiente natural se tornará uma atividade econômica que disputará espaço no mercado em condições iguais ao ato de consumir o ambiente

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Por muito tempo houve uma expansão “agressiva” das atividades econômicas sobre nossa cobertura nativa. Em cinco séculos até o presente, as iniciativas antrópicas – da população brasileira sobre seu ambiente – na agropecuária, na mineração, industrialização e urbanização, desfalcaram em 38% a cobertura natural do nosso território, segundo o MapBiomas (Coleção 10, 2025). Significa dizer, no entanto, que mais de 60% do ambiente nativo (florestas e demais coberturas naturais) no território brasileiro ainda permanecem intactos. Embora agressiva, essa expansão histórica da economia sobre as coberturas nativas no Brasil ainda é de proporção bastante inferior àquela sofrida pela grande maioria dos países que estarão presentes na COP-30, em Belém, para debater a sustentabilidade planetária. Somos o 14º país que, proporcionalmente ao seu território, mais preserva florestas (ver o quadro), à frente de mais de cem nações, entre avançadas e emergentes.

 

O Centro-Oeste e a região amazônica representam hoje os pontos sensíveis de expansão das atividades humanas que alteram e, por vezes, destroem a cobertura nativa ainda existente. Mas a fase de expansão agressiva foi praticamente substituída por uma nova fase, que podemos chamar de “expansão contida”. Mas contida como e por quem? Na atual fase “contida”, o crescimento de qualquer atividade no território está condicionado a regras rigorosas, balizadas pela nova lei ambiental de 2012 (a Lei 12.651), viabilizada pelo trabalho magistral do relator da matéria, deputado Aldo Rebelo, um brasileiro de escol. Além dessa lei, que marca a virada da secular expansão agressiva para uma fase contida, há um sem-número de dispositivos reguladores do ambiente nas três esferas de governo. E a atuação dos fiscais do “Verde” tem sido bastante eficaz. Dessa efetiva contenção da expansão antrópica vem resultando uma importante inversão das fontes de expansão territorial do agronegócio. São hoje as áreas de pastagens que cedem espaço para a expansão “contida” das lavouras, dentro dos limites da lei ambiental (quadro).

 

Com inteligência, as autoridades brasileiras poderão estabelecer metas graduais de redução até zero das perdas líquidas anuais de cobertura natural. Com esse novo passo, adotado no Planaveg (Plano Nacional de Recuperação da Vegetação Nativa) 2025-2028, uma nova fase – a terceira – se abre: a da “expansão harmoniosa” da sustentabilidade, agora aliada ao crescimento. Para tanto, basta começar a inserir o valor do patrimônio natural na medida da riqueza nacional. Esse valor é calculado na inversa razão do custo de cada hectare adicional de perda da cobertura natural, aí incluídos os efeitos secundários e terciários dessa perda. Um ambiente negocial deve ser criado de modo a permitir que surja uma demanda nacional e internacional pelos contratos de conservação do patrimônio natural, quando devidamente demarcado. A Lei 12.651 prevê tais serviços de conservação. Ao governo cabe estabelecer onde e como surgirão as áreas demarcadas de cobertura natural. O passo seguinte é criar Fundos de Cobertura Natural (FCN) que abrigarão tais ativos ambientais. Serão FCNs públicos – se as áreas forem federais ou estaduais – ou privados, tendo como quotistas os detentores de APPs e Reservas Legais intocadas. Com tal avanço na concepção de um sistema de “preços sociais” para o ambiente, tornar-se-á possível calcular um PIB amplo, que incluirá as “rendas” derivadas dos serviços de conservação da cobertura natural.

Em outras palavras, “poupar” o ambiente natural se tornará uma atividade econômica que disputará espaço no mercado em condições iguais ao ato de “consumir” o ambiente. Calcula-se em cerca de 530 milhões de hectares a área total de coberturas nativas em todos os biomas do Brasil. Agora é necessário criar um mecanismo para converter todo esse “capital morto” em ativo vivo e precificado. Quando um ativo se torna monetizável, também se torna, em princípio, negociável. O ativo ambiental total do país é enorme. Mas quanto vale? Esse valor depende da expectativa que se tenha, no mercado ambiental, do fluxo futuro (descontado) das rendas monetárias que cada área demarcada de preservação possa comandar. A “exploração econômica” desses ativos consiste, justamente, em assegurar sua absoluta conservação mediante parâmetros preestabelecidos. Os demandantes dos serviços de conservação serão os atuais “consumidores do ambiente” no planeta, ou seja, os que poluem e destroem em decorrência de suas atividades econômicas convencionais.

Dando números, imaginemos um FCN-“teste”, constituído pelo governo federal com 10 milhões de hectares demarcados no espaço amazônico. Vamos atribuir o valor inicial de um real por metro quadrado a esse território. Portanto, serão R$ 10 mil por hectare. Com 10 milhões de hectares, a precificação desse FCN irá a R$ 100 bilhões, gerando, por hipótese, uma renda anual de R$10 bilhões. Esta será apenas a precificação de partida desse FCN. Dependendo da evolução da demanda nacional e mundial por serviços de conservação, a renda anual auferida deve variar e, ao que tudo indica, produzirá uma persistente valorização patrimonial dos FCNs. A União, detentora inicial de vários FCNs, pode e deve cogitar de incorporar esses ativos ao fundo previdenciário nacional (o FRGPS) ao amparo do art. 250 da Constituição Federal e do art.68 da Lei de Responsabilidade Fiscal. Em menos de três décadas, esses ativos verdes terão um valor de mercado capaz de lastrear uma parcela relevante dos compromissos previdenciários, assim bancando novas gerações de contribuintes da previdência social num futuro regime de capitalização.

A criação de riqueza verde não é figura de linguagem. Riqueza verde é riqueza viva, uma vez capturada como valor tangível e devidamente apropriada pela grande massa dos brasileiros como ativo previdenciário. O capital do futuro é verde.

As opiniões expressas neste texto são de responsabilidade exclusiva do(a) autor(a) e não refletem, necessariamente, o posicionamento e a visão do Estado de Minas sobre o tema.

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