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A menos de uma semana da materialização do tarifaço ameaçado por Trump sobre as exportações brasileiras para os EUA, continuamos praticamente inertes sobre a questão prática: quem vai abrir a caixa de ferramentas do governo para ajudar o país a conter os danos do castigo prometido pelo presidente americano. Não importa, nesse momento, se a ameaça trumpista é pouco ou muito injusta. De fato, ela nem parece ser plausível à luz da legislação em que se apoia, uma lei americana de 1977 que autoriza o presidente a defender os interesses daquele país diante de uma ameaça iminente à sua defesa ou à sua economia. A razão do “perigo brasileiro” seria pela recente atuação do nosso governo como promotor de uma proposta dos Brics para aposentar o dólar como moeda de referência no comércio internacional. Esse tema, de fato, é sensível para os americanos. Mas está longe de configurar qualquer ameaça, muito menos iminente, contra a segurança dos Estados Unidos. As ações atabalhoadas do próprio Trump na condução da política externa americana – estas sim – seriam razão muito mais grave de preocupação sobre o futuro protagonismo dos Estados Unidos no tabuleiro das nações. Trump isola os Estados Unidos e fere sua própria Constituição – que é um pilar da Liberdade e dos Direitos da Pessoa Humana – ao agir contra a boa organização do comércio mundial.
O tema do tarifaço contra os produtos brasileiros continua pendente na mesa das autoridades em Brasília como uma bomba prestes a estourar sobre o fluxo de caixa e os projetos de investimentos de milhares de empresas envolvidas na atividade de exportar para os EUA. Haddad anunciou esta semana que “medidas estariam sendo concluídas pelos técnicos da pasta”. Parece que o governo não tem pressa nem enxerga calendário. Lula, como presidente, mais se parece com um animador de auditório, com suas tiradas de falsete, chamando Trump para um confronto de mentirinha. Uma retaliação por parte do Brasil, neste momento, em nada contribuiria para amenizar o tranco que já começa a ser calculado por vários núcleos de pesquisa. Nossa equipe na RC Consultores prevê, mesmo sem retaliação, que o Brasil deve perder – na hipótese de ficar inerte diante do tarifaço – com um recuo da produção nacional, da ordem de 5% (ver quadro) – que pode até soar pouco à primeira vista, mas significa a destruição de mais de um milhão de empregos nos próximos 24 meses e a eliminação da atual fase favorável de crescimento da renda salarial e do consumo. Já no cenário de retaliações de um lado e de outro, o inferno seria o limite, o que absolutamente não harmoniza com o sonho eleitoral de Lula e do PT em 2026.
O limão azedo do tarifaço precisaria virar uma limonada para amortecer as repercussões previstas nas primeiras estimativas de impacto em setores importantes do agronegócio – como carnes, café, suco de laranja, frutas frescas, pescados e madeiras – bem como na indústria, que será atingida em vendas de aeronaves, ferro, aço e alumínio, máquinas e motores elétricos, papel e celulose, calçados, móveis de madeira, produtos de borracha, plásticos e produtos químicos. A desarticulação de investimentos se fará presente, acentuando as incertezas da economia interna na virada para 2026. Por isso, o limão de Trump tem toda pinta de azedar o cenário eleitoral e jogar a freada da economia na conta política do atual governo.
Se estivesse pensando em fazer desse limão uma limonada, Lula deveria estar concentrado em fortalecer o Brasil pelo lado da sua economia interna. Para colocar bastante água e açúcar no limão do Trump, o governo brasileiro pode lançar mão de uma arma quase secreta e pouco disponível em outros países: a força e o tamanho do nosso mercado interno. Para absorver boa parte das perdas esperadas do tarifaço, é possível começar atuando aqui mesmo, dentro das variáveis de controle da economia interna. O conjunto de medidas compensatórias exigiria um presidente com outra cabeça. Mas não custa enunciar a agenda mínima, que começa por se articular uma escada de descida antecipada e gradual do juro básico, atualmente em 15%, para 12% no máximo. Tal articulação dependeria, por óbvio, em medidas do Conselho Monetário Nacional, até para redefinir e antecipar a meta orçamentária de 2026, adotando uma corajosa revisão geral de despesas públicas e a convocação dos demais poderes (Legislativo e Judiciário) a mudarem sua postura em relação à atitude de gastança que hoje prevalece nos gabinetes da capital.
Sem ser sua intenção, Trump ofereceu sobrevida a Lula e, de tabela, enorme oportunidade para a sociedade brasileira repactuar seu compromisso com a prosperidade. É momento de uma convocação interna à adoção de verdadeira agenda de superação. A nossas lideranças empresariais caberia fazer propostas objetivas e práticas, na direção de melhorar as condições financeiras e tributárias de todas as empresas brasileiras, não só pelo barateamento do crédito (a começar, pela suspensão da majoração do IOF) como também pela eventual antecipação dos efeitos da reforma tributária, especialmente pela remoção total dos impostos sobre a cesta básica alimentar. Medidas desse quilate favorecerão a aceleração de negociações no âmbito do Mercosul e da União Europeia. O Brasil poderá ainda colher amplos frutos da trombada trumpista. Em termos de superação e reencontro com um futuro melhor, o tarifaço virou um limão dourado.
As opiniões expressas neste texto são de responsabilidade exclusiva do(a) autor(a) e não refletem, necessariamente, o posicionamento e a visão do Estado de Minas sobre o tema.