
O Plano Real da Prosperidade
É preciso crescer com muito melhor repartição da riqueza, daí a meta de capitalizar o povo, com mais ativos em imóveis, em ações, em escolaridade e treinamento
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Pessoas interessadas nos meandros da economia brasileira sempre se surpreendem com a capacidade do Brasil de conviver com os solavancos de administrações ruins instaladas em Brasília – como o governo atual, reprovado por cerca de 60% da população, em levantamento recente da Paraná Pesquisas. Embates sucessivos e disputas míopes entre os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário – em completa desarmonia de propósitos – também acentuam a desarticulação da gestão do país e emperram investimentos que poderiam desatar os nós que limitam nosso desempenho a meros voos de galinha.
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Para não haver dúvida sobre o atraso relativo do país frente a outras nações emergentes, basta ver como tem crescido a renda brasileira por habitante, apenas 1% ao ano desde o Plano Real, comparada ao avanço de quase três vezes mais – 2,8% ao ano – da média dos emergentes (excluindo a China, que faria a diferença em desfavor do Brasil ser muito maior).
O mal-estar sentido pela opinião pública – uma certa sensação de nos estarem roubando “o futuro”–, mesmo diante da resistência da economia em sucumbir à desordem dos poderes centrais de Brasília, tem sua razão de ser. A economia do dia-a-dia vai se amparando em forças escondidas que, em boa medida, compensam os desajustes provocados pela desarmonia dos poderes federais.
Uma dessas forças é a forma federativa de governo, que permite atuações compensatórias pelas administrações estaduais e municipais. Felizmente, nem tudo depende “dos homens” em Brasília. A atuação de bons governadores e prefeitos – mais próximos da vigilância dos eleitores – e de bons parlamentares locais, vêm garantindo o espaço de expansão do agronegócio, o respiro das indústrias e o avanço do comércio em grande parte do País.
Os governos da maioria dos estados têm aprovação amplamente majoritária das suas populações – no Paraná, Mato Grosso, Santa Catarina, São Paulo e Goiás, só para lembrar alguns casos mais expressivos de sucessos recentes – assim como em centenas de cidades bem administradas. Felizmente, o Brasil não é um monobloco emperrado, mas a soma complexa de partes e camadas, superpostas, de boas e más administrações.
O segundo garantidor da sobrevivência do país é o conjunto de “pactos” (regras respeitadas pelos poderes) em torno de alguns objetivos de interesse geral, como o controle da inflação e das reservas cambiais – hoje confiadas ao Banco Central – e o controle do orçamento federal e da dívida pública, este na esfera menos bem-sucedida do ministério da Fazenda e dos órgãos de revisão de contas.
Quando reclamamos – e com razão – de tantas oportunidades perdidas pelo Brasil atual, estamos olhando nosso potencial desperdiçado. O passado já foi caótico: a sobrevivência dos negócios e das famílias chegou a depender de uma inflação de três ou quatro dígitos, num país desprovido de míseros dólares de reserva externa para bancar nossas importações essenciais. O pacto em torno da estabilidade de preços está vigente e sustenta nosso precário avanço. Mas é incompleto e insuficiente, como tem sido a herança do Plano Real. É preciso pactuar um Plano de Prosperidade, para completar o Real.
A última grande virada de acerto da economia aconteceu em 1994, com a arquitetura de controles trazida pelo Plano Real e demais providências, como a Lei de Responsabilidade Fiscal (em 2000) e uma regra de Teto de Gastos (em 2016), agora mal substituída por um tal Arcabouço Fiscal (em 2023). O tripé macroeconômico – de câmbio flexível, metas de inflação e superávits primários no Orçamento federal – está manco, sobretudo porque não conseguimos conter a gastança pública, que produz instabilidade de expectativas e juros estratosféricos.
O Congresso, embora tendo culpa no cartório, começa a cobrar “reformas estruturantes”. Mas o que seria isso? Restrições aos gastos? Mais juros? Sabemos, até por intuição, que o plano Real, o da estabilização de preços, requer uma nova estrutura, um novo pacto, mais abrangente. Mas qual?
A Agenda, que precisa ser apresentada em 2027 – aliás antes disso, no debate eleitoral de 2026 –, é sobre um Plano Real da Prosperidade. O Brasil atual sofre de uma espécie de COVID coletiva – doença grave – que invoca medidas de superação, sim, no campo fiscal, como é frequentemente lembrado por colegas economistas – embora, de fato, exija um desenho muito maior, com foco no crescimento, portanto, com medidas voltadas à PROSPERIDADE individual de cada cidadão, algo muito mais profundo do que a distribuição emergencial de bolsa-família, BPC, auxílio pé-de-meia, conta de luz grátis e outras medidas de “argentinização” da cidadania brasileira.
Estamos falando de um novo arranjo, mediante revisão constitucional ampla, que invoque um conjunto de “metas estruturais” – um efetivo tripé da prosperidade – contemplando mais investimento interno (público e privado), a capitalização da população trabalhadora e um teto para a dívida pública. Investir mais é a condição para o País crescer mais.
Mas é preciso crescer com muito melhor repartição da riqueza, daí a meta de capitalizar o povo, com mais ativos em imóveis, em ações, em escolaridade e treinamento e sustentação ambiental. Portanto, a meta é de mais poupança popular, sobretudo a previdenciária. Isso fará a revolução distributiva de novas riquezas criadas. E, para completar, cabe realizar tudo isso sem ferir um teto de endividamento público, o que nos remete de volta à revisão completa do orçamento público.
A janela de oportunidade de um Plano Real da Prosperidade se avizinha. O debate em torno desse novo tripé estrutural precisa começar agora mesmo.
As opiniões expressas neste texto são de responsabilidade exclusiva do(a) autor(a) e não refletem, necessariamente, o posicionamento e a visão do Estado de Minas sobre o tema.