Paulo Delgado
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Guerra de potências militares no Ártico

O Ártico abriga vastas reservas de petróleo, gás natural e minerais, tornando-se um polo de interesse geopolítico e econômico

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O Ártico, pouco lembrado e bastante falado por conta do banzé de Donald Trump com relação à Groelândia e ao Canadá, desempenha um papel fundamental em diversas dinâmicas globais. É uma região de alta importância estratégica, ambiental e econômica, cuja relevância aumenta com o passar do tempo.


Sua influência na regulação climática global é inegável, já que suas calotas de gelo atuam como um termostato natural, refletindo a radiação solar e mitigando o aquecimento global. Além disso, o Ártico abriga vastas reservas de petróleo, gás natural e minerais, tornando-se um polo de interesse geopolítico e econômico, especialmente à medida que o derretimento do gelo facilita o acesso a esses recursos. No âmbito ambiental, a região é um ecossistema imprescindível, lar de uma biodiversidade ímpar, cuja conservação é vital para a saúde do planeta. Por fim, o derretimento das geleiras está abrindo novas rotas de navegação, como a Passagem do Noroeste, transformando o Ártico em ponto estratégico para o comércio global.


Historicamente, o Ártico, cujas águas e ilhas sofrem com uma série de reivindicações contestadas de soberania, tem desempenhado um papel estratégico para os Estados Unidos, as potências europeias e a Rússia que ali desempenham infindáveis operações de vigilância.


Uma curiosidade é que a entrada dos EUA em território ártico se deu através da aquisição do Alasca, comprado dos russos em 1867. Atualmente, o Ártico continua a ser de vital importância para qualquer país que mais conseguir explorar a região. Além disso, como o derretimento do gelo está ampliando a fronteira agrícola na sua periferia e abrindo novas rotas de navegação entre o Atlântico ao Pacífico, novas formas de aproveitar economicamente essa região aparecem.


Ao mesmo tempo, a intensificação da presença militar de outras potências no Ártico, como a Rússia e, cada vez mais, a China, exige um equilíbrio cuidadoso entre defesa, sustentabilidade e cooperação internacional. Todavia, ser cuidadoso não é bem o que caracteriza Trump. Seu instinto, como fica claro com seus blefes com relação à Groelândia, ao Canadá e ao Panamá, é o de jogar com a imprevisibilidade de seus próprios atos e menosprezar práticas institucionalizadas.


Um esforço de institucionalização para a região foi a criação do Conselho do Ártico, estabelecido em 1996 para promover a cooperação, coordenação e suavizar a interação entre os chamados “Estados do Ártico”. Tanto os EUA quanto a Rússia têm assento no Conselho, o qual foca em questões ambientais e de desenvolvimento sustentável na região, e considerações militares. Para além das duas superpotências, são membros cinco países participantes do Mercado Comum Europeu, mais o Canadá.


Embora não seja um Estado do Ártico, a China participa do Conselho como “observador” se declarando um “Estado próximo do Ártico” como parte de sua estratégia para legitimar e ampliar sua influência na região. A política ártica da China inclui planos para lançar uma Rota da Seda Polar, conectando o Ártico à sua visão em torno do velho Império do Meio, através da sua iniciativa Cinturão e Rota.


A proposta de compra da Groenlândia ventilada já no primeiro governo Trump e repetida agora, reflete uma estratégia geopolítica de parte dos Estados Unidos para expandir sua influência no Ártico e ter acesso a recursos até então preservados sob o gelo. Da mesma forma, a ideia ainda mais esdrúxula de anexar o Canadá como estado seria uma tentativa de assegurar total controle sobre o corredor ártico e consolidar a América do Norte como um bloco unificado frente ao que imaginam ser a possibilidade de ações cada vez mais orquestradas entre a Rússia e a China, seja no Ártico, seja em outras esferas.


Entretanto, essas ambições enfrentam resistências óbvias e significativas. A União Europeia, que mantém interesses no Ártico por meio de países como a Dinamarca – que administra a Groenlândia, cada vez mais à vontade para se desligar de Copenhague –, dificilmente aceitaria ceder influência sobre a região sem contrapartidas vantajosas. A Rússia, por sua vez, veria tais movimentos como uma ameaça direta à sua posição estratégica e responderia com maior presença militar e diplomática na região. A China, provavelmente se oporia a um controle norte-americano ampliado.


Ademais, movimentos dos EUA para expandir sua presença sobre o Ártico intensificariam a lógica expansionista russa sobre a Ucrânia e demais territórios adjacentes. Afinal, todo o banzé viraria um suco contrário aos princípios do direito internacional estabelecidos no pós-1945, que insistem na preservação da soberania territorial e na resolução de disputas por meio da diplomacia. Ideias que parecem fazer parte de um mundo cada vez mais do passado.

 

As opiniões expressas neste texto são de responsabilidade exclusiva do(a) autor(a) e não refletem, necessariamente, o posicionamento e a visão do Estado de Minas sobre o tema.

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