
Nada é mais ESG do que um prédio retrofitado
Regeneração das zonas centrais das cidades e programa de retrofit de prédios são o antídoto contra invasão e ocupação de áreas de proteção ambiental por favelas
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O Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) promoveram, nesta última semana, um fórum voltado para desenvolvimento urbano, iniciativas e formas de financiamento. A temática é bastante ampla e o universo de casos, quase infinito; o fórum poderia se estender por semanas com casos e iniciativas ao redor do mundo, tal a importância do tema e os esforços mundiais. A organização do evento foi feliz na curadoria, que espelha o cenário atual e direções possíveis.
Cada grande área tem um léxico particular, com terminologia própria e acrônimos amplamente utilizados, e recorrentes. Revitalização, vitalidade, regeneração, recuperação, sustentabilidade, resiliência, patrimônio, densidade. Com a proximidade da COP30 em Belém, o léxico do clima, com maior ou menor grau de emergência, também estava presente. Pela própria feição do anfitrião, o léxico social também, e o acrônimo ESG foi continuamente lembrado e louvado, usado sem moderação como uma espécie de “selo de bom-mocismo” ou chancela de “bem intencionado”.
O ESG me lembra, hoje, a moda da ISO 9000 no início dos anos 2000, que prometia eliminar desperdícios e aumentar a produtividade global. Abraçar a ISO era a garantia de que tudo funcionaria dentro das empresas, e que a qualidade dos serviços prestados e produtos fabricados estaria, magicamente, em um novo patamar. Não que não fosse importante, nem trouxesse melhorias reais (porque sim, trouxe, para quem implementou direitinho), mas foi o afã com que foi apresentado, a exigência exagerada, a urgência para que toda e qualquer empresa estivesse imediatamente certificada, e a divisão do mercado entre quem tinha o certificado e quem não tinha, que transformaram uma boa iniciativa num mercado cativo de consultorias cada vez menos relevantes, e mais pasteurizadas.
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O acrônimo (ESG) é tão amplo e abrange tantas coisas que permite as interpretações mais diversas sobre seus os objetivos. Cada empresa, cada entidade, não raro, escolhe investir quase que num dos aspectos apenas, dando forma a uma interpretação muito particular do ESG, pervertendo a própria essência e comprometendo os avanços possíveis.
Eu também tenho a minha versão particular do que seja (e para que serve) o ESG, e não perdi a chance de a expor, na seção de perguntas de um dos ótimos painéis do fórum, que tratava de revitalização de zonas centrais das cidades, formas de financiamento e, claro, retrofit de prédios desocupados.
- Retrofit ou regeneração?
- Regeneração urbana: O Centro como oportunidade de desenvolvimento da cidade
- Olhar para o Centro, juntos
Mais do que uma pergunta, era mesmo a formulação de um pensamento sobre a importância que o retrofit de prédios sem uso (ou propensos para atualização e uso residencial) tem: um prédio existente, ao ser retrofitado, não gera demolição expressiva, não gera material para transporte e descarte, não exige escavação e terraplenagem, não demanda transporte de terra e bota-fora, não consome madeira na confecção das fôrmas da estrutura, não consome ferragem e concreto, escoras e tanto material e equipamentos entrando e saindo, quase não demanda tijolos. E fica melhor, porque todos os sistemas prediais, equipamentos e instalações que serão atualizados ou refeitos, serão por versões mais modernas e com consumo de água e energia muitíssimo otimizados. Os elevadores serão modernizados ou substituídos e os sistemas de segurança incrementados. A edificação será recuperada, e o quarteirão passará a contar com - ao menos - um ponto revitalizado, a irradiar segurança, movimento e beleza.
Se for pensar, nada mais ESG numa cidade. Nada mais ambientalmente sustentável, nada mais socialmente defensável, nada mais positivo para a governança das zonas centrais. Em qualquer dimensão, sob qualquer ótica, retrofitar prédios e repopular (ou aumentar a densidade) as zonas centrais deveria ser o “carro-chefe” na agenda ESG urbana.
A regeneração das zonas centrais e o programa de retrofit de prédios são o antídoto contra a invasão e a ocupação de áreas de proteção ambiental por favelas. E essa é a imagem que os visitantes da COP 30 levarão de Belém e do Brasil, uma das cidades com menor índice de coleta e tratamento de esgoto, com um enorme contingente de sua população morando em favelas e palafitas em áreas protegidas, e num nível de degradação ambiental severo. Se a ideia da COP 30 é impactar o visitante para as consequências da falta de planejamento urbano, do espalhamento da cidade, do risco de administrações municipais ruins e da corrupção, o recado será dado, e será impactante.
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Mas se a ideia era mostrar caminhos, deveriam ter feito na cidade do Rio ou em Porto Alegre, cidades que já se movimentam na direção correta, tendo a regeneração das zonas centrais e a mitigação de riscos naturais como plataforma. Em ambos os casos (assim como em qualquer outra metrópole), a regeneração das zonas centrais e o retrofit em particular são as estrelas reais do ESG e os veículos para um futuro melhor.
O painel no fórum do BNDES e do BID reconhecem essa realidade, na medida em que trazem incorporadores imobiliários para o debate e para a equação. E a COP 30, trará quantos?
As opiniões expressas neste texto são de responsabilidade exclusiva do(a) autor(a) e não refletem, necessariamente, o posicionamento e a visão do Estado de Minas sobre o tema.