
Na dúvida, fique com a Zara
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De onde vem o sucesso da marca Zara? Analistas de mercado diriam que por sua habilidade de produzir a fast-fashion numa escala e velocidade impressionantes, entregando moda criada a partir das tendências mais recentes, e muito rapidamente. Com uma fórmula nada secreta, onde logística e a produção just in time trabalham juntos num grau de sincronismo impressionante, o resultado aparece (mas isso pode ser replicado, basta querer).
O que diferencia a Zara de tantas outras empresas é o seu “molho” especial, o ingrediente (nem tão) secreto: a capacidade de seu time de design de criar uma infinidade de peças com design contemporâneo, de bom gosto e a baixo custo. O que se vê nas passarelas e editoriais de moda surge, numa questão de semanas, nas lojas da marca.
A parte mais importante da engrenagem empresarial de um dos maiores varejistas do planeta é, portanto, o design que atrai fãs e clientes dos mais diversos extratos sociais, preferências e geografias. Vende muito, e vende por todo o planeta, transcendendo as culturas locais.
Corta para o mercado imobiliário, fazendo um paralelo realmente simples: se é possível criar design de qualidade, com muita amplitude, grande quantidade e num curtíssimo espaço de tempo na indústria da moda, porque será que o mercado imobiliário insiste numa arquitetura padronizada e sem inspiração, numa indústria onde não há a mesma pressão de tempo, onde os produtos não tem tanta variação ou amplitude, e são o oposto da fast fashion, ou seja, feitos para durar, uma presença perene na paisagem?
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Porque será que o que é criado para desaparecer rapidamente recebe uma atenção gigante na fase do design, enquanto o que é feito para durar para (quase) sempre não recebe a mesma atenção na arquitetura? O que impediria os incorporadores de realmente dedicar tempo e atenção ao design de seus prédios? Qual é a impossibilidade de criar objetos que sejam harmoniosos, esteticamente defensáveis e, acima de tudo, belos?
A impressão que dá é que, fosse o mercado imobiliário e a arquitetura dos prédios um espelho do setor de alimentação, a maior parte dos pratos seriam de apenas dois tipos: um mexidão de cor e gosto indeterminados, criado às pressas e com as sobras da feira, ou ostras congeladas com gás metano da Groenlândia, reduzido em aceto balsâmico produzido pelos índios Pataxós, desconstruídas sobre uma cama de hortaliças orgânicas cultivadas no alto do Himalaia. E uma pitada de pólen de abelhas que vivem apenas no setor sul de Madagascar.
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O que as cidades mais recebem, atualmente, são prédios de arquitetura insípida, sem graça e sem qualquer beleza ou proporção, ou edifícios escalafobéticos e absurdamente datados, mas assinados por marcas conhecidas. Em minha modesta opinião, melhor seria (para a cidade) contratar o departamento de design da Zara, em vez de apostar em marcas como Pininfarina, Porsche e Armani.
Não é que não haja espaço para a arquitetura do espetáculo. Há nos museus, há em edifícios institucionais específicos, como casas de espetáculos, edifícios religiosos, bibliotecas, estádios e aeroportos, sobretudo quando o objetivo daquela cidade é sobressair no cenário mundial ou fomentar o turismo local.
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Mas essas são as exceções numa cidade, porque quando são a regra, a sinfonia perde a harmonia e se transforma numa cacofonia visual. O bom gosto, a inteligência, a proporção e o sentido estético precisam encabeçar a lista do que qualquer prédio deveria observar em sua concepção, superando em importância, inclusive, a obsessão que o mercado imobiliário tem pela solução das plantas, com aproveitamento de cada milímetro quadrado, eliminando oportunidades para a criatividade e o inusitado se manifestarem.
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E é, retirando a chance de uma boa surpresa, que a volumetria acaba sendo pouco mais do que uma consequência direta das plantas, e daí para a sequência de fachadismos, alegorias e fitas de LED, é apenas um passo.
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As opiniões expressas neste texto são de responsabilidade exclusiva do(a) autor(a) e não refletem, necessariamente, o posicionamento e a visão do Estado de Minas sobre o tema.