
A educação para o Estoicismo
Os estoicos formavam cidadãos do mundo. Já a educação atual forma consumidores — no máximo, candidatos a CEO
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Imagine o seguinte cenário: um jovem romano acorda ao som do silêncio estoico. Nada de celular vibrando, nem de notificação dizendo “seu Enem está em 127 dias”. O que ele tem pela frente é mais austero: aulas com Epicteto, exercícios de autocontrole, leituras de Zenão e... meditação sobre a morte.
Enquanto isso, o jovem contemporâneo — esse mártir da ansiedade gamificada — pula da cama com o despertador em forma de funk motivacional, corre para a escola, assiste a sete aulas diferentes, aprende nada profundamente, decora tudo superficialmente e sai pensando que filosofia é sinônimo de “textão com palavras difíceis”.
A educação estóica era uma fábrica de sujeitos. A nossa? Um fast-food de performances.
Na Grécia helenística e na Roma imperial, o estoico não aprendia para passar em prova: aprendia para viver. O currículo era simples e direto: física (para entender o cosmos), lógica (para não dizer bobagens) e ética (para não ser uma bobagem). O objetivo? A eudaimonia, aquela felicidade que não se abala com a queda da Bolsa, o fim do namoro ou a ausência de Wi-Fi.
Os mestres estóicos ensinavam o discípulo a distinguir entre o que depende de nós e o que não depende. Isso parece banal — até você perceber que 98% das suas angústias são justamente sobre o que não depende de você. O estoico aceitava a morte, a doença, o fracasso e o exílio como eventos naturais. O adolescente moderno, por sua vez, entra em colapso porque tirou 7,4 numa prova de Matemática e a média era 8.
Na educação contemporânea, vendemos a ilusão do “você pode tudo se quiser muito”. O estóico, com a frieza de um iceberg, diria: “Você não pode nada, a não ser sua disposição em reagir com dignidade ao que a vida lhe dá.”
Outra diferença gritante: os estoicos formavam cidadãos do mundo. Marco Aurélio, imperador filósofo, meditava todos os dias sobre sua condição de parte da Natureza, membro de uma comunidade racional universal. Já a educação atual forma consumidores — no máximo, candidatos a CEO.
E quanto à formação do caráter? Para os estóicos, essa era a grande finalidade de uma proposta educativa. Eles acreditavam que o verdadeiro ensino moral acontecia no convívio, no exemplo, na prática diária da razão. Já a nossa educação moral se resume a cartazes na escola com frases do tipo “Bullying não!”, “Respeito é tudo” e “Quem bate esquece, quem apanha não”. A ética se tornou um meme institucional.
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Claro que não devemos idealizar o passado. Os estóicos também tinham seus problemas: elitismo, distanciamento social, excesso de racionalismo. Mas entre a frigideira quente da educação mercantilizada e o gelo seco da filosofia estoica, ao menos eles sabiam o que queriam formar: um sujeito que suportasse a tragédia com compostura, e não um adolescente viciado em dopamina digital.
Se Sêneca ressuscitasse hoje e visse o que fizemos com a palavra “educação”, teria uma síncope. E depois escreveria uma carta: “Sobre a brevidade do boletim.”
As opiniões expressas neste texto são de responsabilidade exclusiva do(a) autor(a) e não refletem, necessariamente, o posicionamento e a visão do Estado de Minas sobre o tema.