
A justiça não é cega, ela tem olhos azuis
'Acredito que você que está lendo esse texto muito provavelmente se deparou em algum momento da última semana com o choro do jogador de futebol, Luighi'
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No início deste ano, o juiz Carlos Eduardo Lora Franco, da terceira Vara Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo, afirmou não haver dúvidas que uma mulher de 22 anos denunciada por três seguranças negras cometeu o crime de injúria racial. O que não me surpreendeu, mas me indignou lendo as notícias desse caso foi que ainda sim o juiz decidiu absolvê-la do crime, com a alegação que a condenação atrapalharia o futuro brilhante da jovem que é uma estudante de administração.
As vítimas foram violentadas pela racista enquanto trabalhavam. A racista usou das ofensas: “preta suja, fedida, macaca, eu tenho nojo de vocês, vadia, puta”. No exame de corpo delito ficou constatado que a jovem absolvida pelo juiz, além de proferir frases racistas, também mordeu uma das vítimas. Acredito que você que está lendo esse texto muito provavelmente se deparou em algum momento da última semana com o choro do jogador de futebol, Luighi quando indignado perguntou a quem o entrevistava se não iria pontuar o crime ao qual ele foi vítima durante uma partida de futebol. Durante o jogo, o atleta do Palmeiras foi violentado com gestos e chamado de macaco pela torcida adversária no Paraguai.
Se esse episódio ocorresse em São Paulo, cidade que sedia o time do Palmeiras, e o juiz Carlos Eduardo Lora Franco fosse incumbido de julgar, muito provavelmente absolveria o criminoso novamente. Afinal de contas não há diferença nos crimes, o Luighi estava trabalhando e as três moças também, não é mesmo? Ambas violências se enquadram no crime de injúria racial que desde 2023 é equiparado ao crime de racismo, portanto inafiançável. Mas geralmente quem é alvo do crime de racismo são cidadãos negros, já quem ocupa uma vaga no sistema de justiça e julga os casos são profissionais brancos.
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Outro dia eu li nas redes sociais a frase “a justiça não é cega, ela tem olhos azuis” e fiquei reflexiva quanto a afirmação. Essa frase mexeu comigo porque sei que o racismo é crime inafiançável no Brasil. Entretanto, assistimos um episódio seguido de tantos outros, todos os dias e nenhuma pessoa está cumprindo pena em um presídio brasileiro condenada por racismo. E a questão ao meu ver é: se assistimos casos e mais casos de racismos na imprensa tradicional, nas redes sociais e no cotidiano de nossas vidas, algum cúmplice dentro do sistema de justiça as pessoas que cometem esse crime devem ter.
A partir dessa reflexão divido algumas perguntas com você : O que motivou o juiz Carlos Eduardo Lora Franco ter mais empatia com a racista do que com quem foi violentada por ela? O que motivou um jornalista ignorar os ataques ao Luighi e fazer de conta que nada aconteceu? O que motiva inúmeras pessoas a alegarem falsamente que racismo não existe no Brasil? Se você tiver a resposta me liga, me manda um telegrama ou um e-mail.
Essa atitude do juiz e do entrevistador são recorrentes para convencer que a dor do Luighi e de todas as pessoas negras expostas ao racismo não é nada de mais e que ele e todas nós não deveríamos se importar com isso. Assim como as seguranças devem perdoar a mulher branca que as violentou. Caso não perdoem as taxadas de raivosas serão elas.
O sistema de justiça continua sendo branco e responsável pela desumanização das pessoas negras, negando direitos, reforçando estereótipos, associando a negritude à criminalidade, delinquência e legitimando a violência de pessoas brancas contra negras. Um histórico que mostra nitidamente que pessoas racistas não são criminalizadas e levadas aos presídios brasileiros mesmo o racismo sendo crime inafiançável no nosso país.
As opiniões expressas neste texto são de responsabilidade exclusiva do(a) autor(a) e não refletem, necessariamente, o posicionamento e a visão do Estado de Minas sobre o tema.