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Por Isabel Gonçalves
“Se eu tivesse esperado mais um mês, podia ter economizado metade do que gastei.” Foi o que pensou Ana Luísa quando viu as manchetes sobre o novo projeto de lei que permite tirar a CNH (Carteira Nacional de Habilitação) sem passar por uma autoescola. Ela havia acabado de pagar quase R$2.800 para dar início às aulas de direção.
A ideia é que o processo de tirar a habilitação realmente fique mais simples e barato. Os futuros motoristas e famílias comemoram a chance de aliviar o orçamento, mas será que não tem nenhuma letra miúda nessa história toda? Entenda como se preparar financeiramente caso a CNH sem autoescola se torne realidade.
O que é preciso para fazer uma CNH?
No Brasil, o processo para obter a CNH é bastante burocrático. Segundo o Código de Trânsito Brasileiro (CTB), as etapas envolvem:
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Exames médico e psicológico, para avaliação da aptidão física e mental do futuro condutor.
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Curso teórico de formação, 45h-aula com temas como direção defensiva, cidadania e primeiros socorros.
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Prova teórica no Detran, o famoso exame de legislação de trânsito.
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Aulas práticas, em que são exigidas no mínimo 20 horas de aula prática, todas ministradas por instrutores vinculados às autoescolas. Além disso, é necessário pagar a taxa da Licença de Aprendizagem.
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Exame de direção, com avaliadores do Detran de cada estado.
Todas essas etapas envolvem custos e taxas diferentes. Ou seja, além de burocrático, o processo também é caro. Em estados como Minas Gerais e São Paulo, por exemplo, o preço médio da CNH varia entre R$2.500 e R$3.000, um valor fora da realidade de boa parte dos jovens.
Qual a nova regra para tirar habilitação?
A proposta da CNH sem autoescola faz parte de um projeto de lei, ainda em discussão, que pretende flexibilizar a obrigatoriedade de frequentar aulas em autoescolas para obter a primeira habilitação. O que quer dizer que os cursos preparatórios, teóricos e práticos, passam a ser opcionais.
Na prática, o candidato ainda precisaria cumprir as etapas exigidas, como exames médico e psicológico, prova teórica e exame prático, mas poderia se preparar por conta própria ou com o apoio de instrutores independentes credenciados pelo Detran.
Segundo o Ministério dos Transportes, o objetivo do projeto é “democratizar o acesso à habilitação”, ampliando a oportunidade para quem hoje não consegue arcar com os custos altos do processo tradicional.
Por que o valor da CNH é tão alto atualmente?
Tirar a carteira de motorista no Brasil, é quase um investimento de médio prazo. Porque o custo da habilitação pesa, e muito, no orçamento de quem vive com renda apertada.
Parte da resposta está na estrutura burocrática, cada etapa é acompanhada por taxas, regulamentações e exigências que formam um verdadeiro labirinto administrativo. Por trás de cada valor pago há uma engrenagem de fiscalização, equipamentos obrigatórios, custos de manutenção de veículos, remuneração de instrutores e impostos embutidos.
A autoescola, nesse contexto, funciona como uma intermediária entre o cidadão e o Estado: ensina, treina, organiza e entrega o candidato pronto para o Detran. Mas essa intermediação tem um preço, e é justamente ele que a nova proposta tenta rediscutir.
Como a CNH pode ficar mais barata sem autoescola?
A principal economia viria da eliminação da obrigatoriedade das aulas em autoescolas, que hoje representam mais de 60% do custo total da habilitação. Mas vale lembrar que essa etapa não sairia de graça. Ainda existem os gastos com materiais para estudar por conta própria e contratar instrutores autônomos a preços mais acessíveis.
A grande vantagem é a possibilidade de comparar valores e negociar diretamente com profissionais, em vez de aceitar preços padronizados por uma instituição. Em outras palavras: o projeto não elimina gastos, mas descentraliza a cobrança, devolvendo ao candidato o poder de decidir onde e como gastar.
Simulação: quanto você gastaria em cada etapa tirando carteira em MG
Em larga escala, isso pode representar centenas de milhares de reais economizados por ano pelos novos condutores. Mas em contrapartida, pode ser uma perda significativa de receita para o setor de autoescolas.
O impacto da CNH sem autoescola além do bolso
A discussão sobre a CNH sem autoescola não envolve apenas economia para o bolso dos condutores. Ela toca diretamente o mercado de trabalho e a sustentabilidade das autoescolas.
No Brasil, milhões de pessoas dependem dessas instituições como fonte de renda. Instrutores, secretárias, coordenadores de cursos e monitores de trânsito seriam impactados.
Esses profissionais defendem que eliminar a obrigatoriedade das aulas presenciais poderia representar uma perda significativa de empregos, além da possibilidade de precarização do trabalho com os instrutores se tornando autônomos.
Além do impacto econômico, surge a pergunta crítica: estudando em casa, o motorista terá a mesma qualidade de direção?
Nos Estados Unidos, por exemplo, muitos estados permitem aprendizado autodirigido com supervisão de instrutores credenciados. Os resultados indicam que o modelo pode até funcionar, desde que haja fiscalização, simuladores de prática e provas rigorosas.
No Brasil, porém, a transição não será simples: a infraestrutura para treinar motoristas de forma remota ainda é limitada, e nem todos os candidatos têm acesso a veículos próprios ou a instrutores credenciados próximos.
Por fim, especialistas alertam que baratear não pode significar afrouxar. A economia imediata é tentadora, mas a formação de um bom motorista também envolve responsabilidade, empatia e prática supervisionada.
Conclusão: liberdade que custa consciência
A proposta da CNH sem autoescola ainda não foi aprovada. Está em consulta pública e é justamente por isso que desperta tanta expectativa.
A medida traz dilemas importantes. De um lado, há a promessa concreta de economia: valores que podem cair pela metade, ou até mais, e finalmente tornar o sonho de dirigir possível para quem sempre esbarrou no preço.
Do outro, há quem diga que não se trata apenas de poupar dinheiro: autoescolas são empregos, renda e experiência consolidada. Instrutores, coordenadores e demais profissionais podem perder funções, e a transição para modelos autônomos exige infraestrutura, fiscalização e disciplina do próprio candidato.
A verdade é que nenhuma economia deve superar a responsabilidade social. Por mais que a CNH sem autoescola promete liberdade e economia, ela também exige consciência, disciplina e responsabilidade. É um convite para que cada motorista assuma não apenas o controle do seu orçamento, mas também a responsabilidade de dirigir com segurança.
Afinal, dirigir é um direito. Mas, antes de tudo, é um compromisso.
As opiniões expressas neste texto são de responsabilidade exclusiva do(a) autor(a) e não refletem, necessariamente, o posicionamento e a visão do Estado de Minas sobre o tema.
