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Por Isabel Gonçalves
Era só um Pix de R$200. Coisa boba, um favor entre amigos. O Pedro estava apertado no fim do mês e prometeu devolver assim que caísse o salário. Acontece que o salário caiu e o Pedro nunca mais falou sobre.
O Vinícius, que emprestou o dinheiro, agora repensa cada mensagem que manda no grupo da galera. Será que está pegando pesado? Será que está sendo chato? Ou será que virou, sem querer, o agiota do rolê? Emprestar dinheiro para um amigo é quase sempre assim, começa com um amigo cheio de boas intenções e, se não tiver cuidado, termina com climão.
O que significa ser um agiota?
Falar que um amigo é agiota não é pra tanto. O agiota é um cara que empresta dinheiro a juros elevados, fora da formalidade e cheio de cobranças abusivas. Ou seja, alguém que você deve ficar bem longe.
Acontece que muitas vezes, principalmente com a economia do país super instável, é comum recorrer a um amigo para ajuda financeira. Seja um Pix, uma compra no cartão de crédito, ou sendo fiador, ser amigo significa estar lá para o que der e vier. Mas será que é assim mesmo? E quando o dinheiro não volta?
A ajuda que virou dívida
Justamente por estar na informalidade, cobrar o dinheiro de volta pode ser uma grande dor de cabeça. Uma pesquisa feita pelo Instituto MindMiners revelou que 71% das pessoas que emprestam dinheiro para os amigos não recebem dentro do prazo combinado.
Aí você pode se perguntar: é crime pegar empréstimo e não pagar? Crime não é, mas você pode ser processado, afinal no papel você está contraindo uma dívida civil, o que pode levar até um bloqueio de bens. Mas antes de chegar a esse ponto, a amizade já voou pela janela há muito tempo.
Por que é tão difícil cobrar um amigo?
Se você está do lado que empresta o dinheiro, provavelmente você é o amigo mais querido entre a galera. Uma outra pesquisa feita pelos economistas Sandra Matz e Joe Gladstone, nos EUA e na Inglaterra, mostrou que pessoas consideradas “gente boa” tendem a ter mais problemas financeiros.
Isso acontece porque essas pessoas geralmente têm uma certa dificuldade em falar “não” e mais ainda de cobrar os pagamentos. Quantas vezes você já começou uma mensagem com “Oi, tudo bem? Então, desculpa te incomodar, mas…”, colocou emoji ou mandou uma figurinha pra dar uma suavizada. Isso tudo com medo de parecer mesquinho ou chato.
Emprestar dinheiro para o amigo mexe muito com a confiança das duas partes. Então, a cobrança acaba virando uma corda bamba emocional. E é aí que muita gente deixa pra lá com medo de perder a amizade.
“Tem que ter vergonha de dever e não de cobrar”
Aposto que você já ouviu isso quando expôs a situação para alguém. E falar é fácil, mas a gente sabe que na prática é diferente. Mas a verdade é que evitar o confronto, somado àquela preocupação com o “o que o meu amigo vai achar?”, pode atrapalhar ainda mais o controle das finanças.
Na vida real, tem gente que some do grupo do WhatsApp, do rolê, da vida. Outros continuam como se nada tivesse acontecido, e aí você fica se perguntando se está sendo dramático demais ou se está, de fato, sendo feito de trouxa. O problema é que, sem diálogo, o ressentimento cresce. E quando o dinheiro entra no meio da amizade sem regras ou combinados, as chances de dar ruim aumentam.
Guia de sobrevivência para quem já caiu nessa cilada
Parece um ciclo sem fim, você empresta o dinheiro, recebe com atrasos ou nem recebe e pouco tempo depois vem outro pedido. Mas antes de tudo é preciso refletir:
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Eu posso abrir mão desse dinheiro, se ele não voltar?
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Estou confortável em conversar sobre isso depois, se precisar cobrar?
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A relação com essa pessoa é madura o suficiente para lidar com esse tipo de acordo?
Se a resposta para alguma dessas perguntas for não, então o melhor mesmo é evitar. E aí entramos em outro ponto: o poder do “não”. Saber falar não é a melhor coisa que você pode aprender na hora de lidar com as finanças.
Por outro lado, se você já decidiu que vai emprestar o dinheiro, seja cuidadoso. É importante estabelecer, de forma bem clara, e de preferência por escrito, as regras do acordo. Estabeleça valores, prazos e forma de pagamento, pode ser por mensagem mesmo.
Para quantias mais altas, pode valer a pena fazer um contrato simples. Existem modelos prontos na internet. O importante é deixar o acordo documentado, mesmo que informalmente, assim a cobrança fica mais fácil.
Dicas práticas para lidar com o empréstimo
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Empreste só o que você pode perder: como você não tem uma garantia, além da palavra do seu amigo, que você vai ver o dinheiro de volta, não prejudique a sua saúde financeira para ajudar a vida financeira do outro.
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Evite misturar ajuda com expectativas: não ajude porque você quer ser bem visto pelo seu amigo, ajude porque você pode. Ah e não espere nada em troca, nem o dinheiro.
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Tenha coragem de cobrar, com leveza: esperar que a pessoa lembre sozinha pode ser a receita perfeita para frustração. Se você combinou uma data, cobre com gentileza, mas com firmeza. E não tenha vergonha de cobrar o que, no fim das contas, é seu.
Conclusão: existe amizade que sobrevive a uma dívida?
É claro que existe, mas não sem esforço, diálogo e, principalmente, maturidade de ambos os lados. Porque o problema não está no dinheiro em si, mas na forma como ele é tratado. A verdade é que a dívida testa a amizade. Ela ajuda a revelar o quanto a relação é transparente, respeitosa e baseada na confiança.
Por isso, é importante ser transparente, saber falar não e estabelecer limites e prazos pode ajudar nessas horas. Assim, você evita mal-entendidos, protege sua saúde financeira e, de quebra, ainda preserva a amizade que, vamos combinar, vale mais do que qualquer Pix.
As opiniões expressas neste texto são de responsabilidade exclusiva do(a) autor(a) e não refletem, necessariamente, o posicionamento e a visão do Estado de Minas sobre o tema.