Lei Antifacção ou antiterrorismo?
PEC da Segurança enviada pelo governo em abril segue parada; governadores de oposição, como Zema, não debatem pontos de discórdia
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Ainda muito se ouvirá falar sobre a Operação Contenção. Em meio a um debate alimentado em campanha antecipada por alguns candidatos à espreita de 121 corpos estendidos ao chão, um pastor de direita subiu à tribuna na Câmara dos Deputados esta semana. O deputado federal Otoni de Paula (MDB-RJ) se identifica como evangélico, preto e de direita. Disse ele: “Quem está falando é pastor. E não é pastor progressista não. Só de filho de gente da igreja, eu sei que morreram quatro. Meninos que nunca portaram fuzis, mas que estão sendo contados no pacote como se fossem bandidos. Nunca ninguém vai atrás para saber (se bandidos ou não). Porque preto correndo em dia de operação na favela é bandido”. Otoni de Paula pressente que a megaoperação carioca – que deixou um rastro de sangue e uma fila de governadores, entre os quais Romeu Zema (Novo) em romaria para prestar “solidariedade” ao governador Cláudio Castro (PL) – tenha levado a senha para que as tropas procedessem à execução sumária sem resultado prático efetivo, já que este é o modelo em voga no Rio nos últimos 30 anos.
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É sabido que os territórios ocupados pelo crime organizado não só no Rio de Janeiro, mas também na Bahia e em cidades do Norte e Nordeste, precisam ser retomados. Ali as populações vivem sob o jugo e a lei das facções. Por retomar o território, entenda-se, o emprego da força, em ações conjugadas entre estados e União, planejadas pela inteligência para identificar lideranças e as suas conexões, em operações desenhadas para reduzir danos colaterais. O imediato e quase simultâneo passo seguinte seria a reocupação dos territórios com a presença do Estado em programas comunitários nos moldes das Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs), implantadas em 2008, em princípio bem-sucedidas, mas que definharam por falta de investimentos, como explica Luís Flávio Sapori, membro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública e professor da PUC Minas.
A senha para matar, sinalização de alguns governantes às suas polícias – com frequência absorvida por segmentos da sociedade desalentados pela violência e desesperados por solução –, não tem efeito prático. Esse tipo de ação alimenta a corrupção policial, como bem explica Sapori. “A polícia que mata muito sai do controle do poder público. O policial começa a usar esse atributo para negociar com o tráfico a preservação da vida dos faccionados”, analisa. O que se viu no Rio de Janeiro nesta quinta-feira foi o território traumatizado pelo sangue derramado entregue às futuras lideranças de facções adversárias ou de milícias, prontas para preencher os espaços de “poder” dos faccionados eliminados.
O debate nasce contaminado por todos os lados, incapaz de gerar unidade em defesa do povo refém do crime organizado. No Congresso Nacional, a PEC da Segurança enviada em abril pelo governo federal agora acorda nas gavetas. Governadores de oposição, como Zema, se recusaram a debater pontos de discórdia da proposta – como a questão da autonomia dos estados, que pode ser resolvida com ajustes. Igualmente, o projeto de lei Antifacção, que deve ser enviado pelo governo nesta sexta ao Congresso, considerado por especialistas um bom texto – atualiza a Lei de Organizações Criminosas de 2013, inadequada para lidar com o crime organizado –, é de antemão desprezado pelos governadores de oposição, que investem em proposição que associa o crime organizado ao terrorismo.
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Em retórica, parece bem. Na prática, um equívoco, explica Sapori. “Essa proposta teria por efeito o acionamento das Forças Armadas para combater o dia a dia do crime organizado. Mas elas não estão preparadas para isso. Isso é mero populismo político”, diz o especialista. Por outro lado, designar facções criminosas como grupos terroristas tem outro efeito colateral, como aponta o cientista político Guilherme Casarões, professor da Florida International University (EUA). “A equiparação entre crime organizado, que é movido por interesses econômicos, e terrorismo, que é uma atividade político-ideológica, abre precedentes para a criação de regimes de exceção no combate ao tráfico de drogas. No plano internacional, daria argumentos para medidas extraterritoriais que têm sido adotadas pelos Estados Unidos”, diz.
Agendas conjuntas
Em agenda no Ministério da Educação, com Camilo Santana (PT), e no Ministério de Minas e Energia, com Alexandre Silveira (PSD), marcadas por Gleide Andrade, secretária nacional de Planejamento e Finanças do PT, o prefeito Gleidson Azevedo (Novo) – irmão do senador Cleitinho (Republicanos) – acompanhou uma comitiva de lideranças do Centro-Oeste mineiro para conversar sobre a inauguração do Hospital Universitário que será instalado na Universidade de Divinópolis. Destinado ao atendimento de toda a região, o hospital terá foco no ensino e na pesquisa, e irá atender 100% a população pelo SUS, segundo anunciou Camilo Santana. No Ministério de Minas e Energia, Gleidson Azevedo agradeceu a Alexandre Silveira o empenho para resolver as demandas do Centro-Oeste mineiro.
Deu match
Alexandre Silveira disse a Gleidson Azevedo que, assim que o programa Gás do Povo chegar a Divinópolis, ele estará presente para entregar os botijões, ao lado do senador Cleitinho, à população carente.
Isenção de IR
O Congresso Nacional aprovou ontem o PLN 1/2025, que abre uma exceção na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) vigente ao prazo de cinco anos para a validade de isenções fiscais. O objetivo é viabilizar o projeto que tramita no Senado de isenção do Imposto de Renda para quem recebe até R$ 5 mil ao mês, tornando permanente seus efeitos em caso de aprovação. Relatado pela senadora Professora Dorinha Seabra (União-TO), a proposta de alteração, segundo ela, traz segurança jurídica ao contribuinte, pois, seja qual for o desfecho da proposição que amplia a isenção da faixa de IR no parlamento, não será obrigatoriamente rediscutida a cada cinco anos.
Jabuti
Além da isenção do IR, o PLN 1/2025 também autoriza o governo a buscar a base da meta fiscal de 2025, e não o centro, como previa o texto original da LDO. Isso abre uma margem de despesas públicas de cerca de R$ 30 bilhões, até então congeladas, viabilizando inclusive o pagamento de emendas parlamentares atrasadas. O texto também define regras para a execução de emendas parlamentares para deputados que perderam o mandato por decisão judicial. Dotações já empenhadas permanecem com o autor original, enquanto as não empenhadas passam ao novo parlamentar, que assume as prerrogativas do autor.
As opiniões expressas neste texto são de responsabilidade exclusiva do(a) autor(a) e não refletem, necessariamente, o posicionamento e a visão do Estado de Minas sobre o tema.
