
Onde está a diversidade que subiu a rampa?
Sabemos que existem muitas pessoas muito qualificadas para ocupar essa posição, inclusive muitas mulheres negras
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Em janeiro de 2023, Lula subiu a rampa do Planalto em Brasília, para receber a faixa presidencial, com um grupo formado por uma pessoa com deficiência, uma mulher, uma criança, uma pessoa negra, uma pessoa indigena e um operário, representando a diversidade da população do Brasil. Mas parece que essa diversidade ficou lá na rampa, pois agora, quando o presidente tem a oportunidade de diminuir um pouquinho a disparidade entre homens e mulheres, e de incluir uma pessoa negra entre os ministros, ele vai escolher mais um homem branco.
É importantíssimo que a vaga aberta no Supremo Tribunal Federal, deixada pelo ministro Luís Alberto Barroso, que se aposentou, seja ocupada por uma mulher ou por um homem negro, ou, de preferência, uma mulher negra, já que hoje não há nenhum ministro negro e apenas uma mulher, a ministra Cármem Lúcia, que assumiu o cargo em 2006.
A Corte chegou a ter duas mulheres simultaneamente, antes de Rosa Weber se aposentar, em 2023, mas, em 134 anos de história, foram 172 ministros, mas apenas três eram mulheres. Reflexo do machismo estrutural que ainda nos atravessa.
Nós, mulheres, somos a maioria da população, mas somos minorizadas na representação em todas as esferas. Conforme o último Censo, somos 51,5% da população brasileira, mas não somos nem 20% dos senadores, nem dos deputados.
Entendemos que há necessidade de uma indicação técnica, e sabemos que existem muitas pessoas muito qualificadas para ocupar essa posição, inclusive muitas mulheres negras. E é necessário sair do lugar comum, no caso a indicação de um homem branco, até por uma questão de reparação histórica. São 134 anos sem nenhuma mulher negra e com apenas três mulheres brancas. Somos a maioria da população e merecemos ter representatividade.
Como escreveu minha amiga Norah Lapertosa: “Ampliar a presença feminina no Supremo, sobretudo de mulheres que compreendam a realidade social brasileira, significa enriquecer o debate, tornar as decisões mais plurais e refletir a diversidade da população que o tribunal serve.
Tribunais mais diversos tendem a construir uma Justiça mais sensível, equilibrada e conectada às necessidades reais do povo. A indicação de uma nova ministra ao STF é um compromisso com a democracia, com a equidade e com a construção de um Judiciário verdadeiramente representativo e capaz de refletir a sociedade em toda a sua complexidade”.
A indicação de mais um homem branco significa a perpetuação de um ciclo de exclusão e evidencia as barreiras impostas às mulheres, especialmente às mulheres pretas.
Mais uma vez, o que vemos é o silenciamento das mulheres, como bem disse a ministra Cármen Lúcia em seu discurso em homenagem ao Dia da Mulher:
"Dizem que nós fomos silenciosas historicamente. Mentira. Nós fomos silenciadas, mas sempre continuamos falando, embora muitas vezes não sendo ouvidas."
Está muito claro que a diversidade não é uma prioridade para o presidente que não acredita que o STF seja lugar para fazer política de diversidade, o que contraria uma promessa de campanha.
Uma política de diversidade deve atravessar todas as esferas, sem exceções. Os requisitos básicos para a indicação ao STF permanecem os mesmos: idade superior a 35 anos, reputação ilibada e notável saber jurídico. Aliás, existem muitas mulheres que atendem muito bem a todos esses requisitos.
A vivência de uma mulher, especialmente de uma mulher preta, é muito diferente da experiência de um homem branco. Essas mulheres são capazes de olhar para questões de gênero que escapam ao olhar masculino; mulheres pretas conhecem bem o que é o racismo estrutural e todos os desafios que precisaram superar por serem quem são.
Apesar de tudo, Lula cogita colocar um homem no STF. E para completar, se tem uma coisa que une a direita e a esquerda é o machismo.
As opiniões expressas neste texto são de responsabilidade exclusiva do(a) autor(a) e não refletem, necessariamente, o posicionamento e a visão do Estado de Minas sobre o tema.