
André Murad
Diretor-executivo da Clínica Personal Oncologia de Precisão de BH. Oncologista e oncogeneticista da OncoLavras.
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"Canetas" emagrecedoras e redução do risco de câncer
A população mundial está continuamente mais pesada, o que torna a obesidade um problema de saúde pública
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11/07/2025 08:04
- atualizado 26/07/2025 12:14
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Vários estudos epidemiológicos correlacionam a obesidade ao aparecimento de câncer. Um estudo mais recente da União Internacional de Controle do Câncer comprovou a relação entre obesidade e câncer. Ele estima que 30% dos casos da doença nos países ocidentais estejam relacionados ao sedentarismo e ao excesso de peso. Este é o segundo fator de risco para o desenvolvimento de câncer, ficando atrás apenas do tabagismo, de acordo a Organização Mundial de Saúde (OMS). A população mundial está continuamente mais pesada, o que torna a obesidade um problema de saúde pública.
Por outro lado, os GLP-1RAs ou agonistas do receptor de peptídeo semelhante ao glucagon-1 são medicamentos usados no tratamento do diabetes tipo 2 e também da obesidade. Eles imitam a ação do hormônio natural GLP-1, que estimula a liberação de insulina e reduz a produção de glucagon, ajudando a controlar os níveis de açúcar no sangue e promovendo a perda de peso.
Os GLP-1RAs de primeira geração para perda de peso, como a liraglutida e a exenatida, parecem apresentar benefícios anticancerígenos que vão além da perda de peso, em comparação com a cirurgia para perda de peso. Este novo estudo foi liderado por pesquisadores do Clalit Health Services em Tel Aviv, Israel, e do Hospital Hasharon, Rabin Medical Center em Petah Tikva, Israel.
O estudo encontrou uma incidência semelhante de câncer relacionado à obesidade entre pacientes tratados com agonistas do receptor do peptídeo semelhante ao glucagon-1 (GLP-1RAs) de primeira geração e com cirurgia bariátrica, apesar da vantagem relativa da cirurgia em maximizar a perda de peso. Mas, considerando essa vantagem, o efeito direto dos GLP-1RAs, além da perda de peso, é 41% mais eficaz na prevenção do câncer relacionado à obesidade.
Os medicamentos GLP-1RA imitam o hormônio GLP-1, que ocorre naturalmente no corpo e desempenha um papel na redução dos níveis de açúcar no sangue e na regulação do apetite. Assim como a cirurgia bariátrica, os GLP-1RA são comumente usados para o tratamento da obesidade, bem como para auxiliar no controle do diabetes tipo 2.
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Obesidade e diabetes são fatores de risco conhecidos para diversos tipos de câncer, incluindo câncer de mama pós-menopausa, câncer uterino, câncer colorretal, câncer renal e hepático, câncer de pâncreas e outros.
No presente estudo, publicado na revista eClinicalMedicine sob o título "Agonistas do receptor do peptídeo-1 semelhante ao glucagon comparados à cirurgia metabólica bariátrica e ao risco de câncer relacionado à obesidade: um estudo de coorte observacional e retrospectivo", os pesquisadores se propuseram a estabelecer a eficácia comparativa dos GLP-1 de primeira geração e da cirurgia bariátrica para a prevenção de cânceres relacionados à obesidade.
Os pesquisadores analisaram dados de prontuários eletrônicos de 6.356 pessoas (61% mulheres) com obesidade e diabetes tipo 2 que haviam sido tratadas com GLP-1RAs de primeira geração — liraglutida, exenatida ou dulaglutida — ou cirurgia bariátrica entre 2010 e 2018 pela Clalit Health Services, a maior prestadora de serviços de saúde pública de Israel. Os pacientes foram avaliados até o final de 2023 para diagnóstico de câncer relacionado à obesidade.
Os autores descobriram que 298 pacientes foram diagnosticados com câncer relacionado à obesidade durante um acompanhamento mediano de 7,5 anos, com 150 dos 3.178 pacientes submetidos à cirurgia e 148 dos 3.178 pacientes em uso de GLP-1 diagnosticados com câncer relacionado à obesidade. O câncer de mama pós-menopausa foi o câncer mais comum relacionado à obesidade, seguido pelo câncer colorretal e pelo câncer de útero.
Após avaliar o efeito comparativo dos GLP-1 além da extensão da perda de peso, a análise dos pesquisadores revelou que os GLP-1RAs tiveram um efeito direto na redução do câncer relacionado à obesidade além da perda de peso, com um risco relativo 41% menor em comparação à cirurgia bariátrica.
Os efeitos protetores dos GLP-1RAs contra cânceres relacionados à obesidade provavelmente surgem de múltiplos mecanismos, incluindo a redução da inflamação.
O estudo é único na literatura, pois o acompanhamento de longo prazo permitiu comparar os efeitos dos GLP1-RAs e da cirurgia com potenciais longos períodos de latência do câncer. GLP1-RAs de nova geração, altamente potentes e com maior eficácia na redução de peso, podem oferecer uma vantagem ainda maior na redução do risco de cânceres relacionados à obesidade, mas pesquisas futuras são necessárias para garantir que esses medicamentos não aumentem o risco de cânceres não relacionados à obesidade.
Os autores enfatizam que, embora essas descobertas sejam importantes, estudos futuros, incluindo ensaios clínicos randomizados e estudos de coorte prospectivos maiores, são necessários para validar os efeitos observados e explorar os mecanismos subjacentes.
Nos últimos anos, outros estudos também observaram os benefícios dos agonistas do receptor de GLP-1 na redução dos riscos de diversos tipos de câncer relacionados à obesidade. Ao analisar mais a fundo os mecanismos moleculares por trás desses efeitos anticancerígenos e examinar mais de perto o papel dos GLP-1-RAs na prevenção do câncer, os pesquisadores podem avançar ainda mais na oncologia de precisão.
As opiniões expressas neste texto são de responsabilidade exclusiva do(a) autor(a) e não refletem, necessariamente, o posicionamento e a visão do Estado de Minas sobre o tema.