
Nem tudo merece sua paz
O que agora parece urgente, ameaçador ou angustiante, muitas vezes perde a força quando visto sob a perspectiva do tempo
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Se algo te preocupa agora, pergunte-se: isso ainda vai importar amanhã? E daqui a uma semana? Daqui a um mês? Daqui a um ano?
Essa simples pergunta pode se transformar em um verdadeiro ponto de virada. Ela nos permite relativizar o peso emocional que muitas situações ganham no auge da emoção. O que agora parece urgente, ameaçador ou angustiante, muitas vezes perde a força quando visto sob a perspectiva do tempo. É um convite para sair do imediatismo emocional, acessar o olhar do futuro e encontrar a proporção para o que se está vivendo.
Esse exercício é especialmente útil diante de decisões difíceis, conflitos emocionais e momentos de ansiedade. Em meu dia a dia, tanto pessoal quanto nos atendimentos como terapeuta e mentora, percebo o quanto essas reflexões ajudam a colocar as emoções em perspectiva. Frequentemente, quando um cliente chega angustiado, dividido ou se sentindo pressionado a tomar uma decisão, trago essas perguntas como um convite à autorresponsabilidade emocional e ao equilíbrio. E o efeito costuma ser transformador.
Essas frases não são fórmulas mágicas, mas sim práticas de consciência. Elas não evitam a dor, mas nos ajudam a entender o tamanho real dela, impedindo que sejamos engolidos pelo que sentimos.
Esse olhar mais amplo e racional vem de uma filosofia antiga, mas incrivelmente atual: o estoicismo. De forma simples, o estoicismo é uma corrente filosófica que surgiu na Grécia Antiga e foi muito difundida em Roma. Seus principais representantes, como Sêneca, Epicteto e Marco Aurélio, defendiam que a felicidade e a liberdade interior não dependem das circunstâncias externas, mas sim de como reagimos a elas.
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Para os estoicos, devemos focar naquilo que está sob o nosso controle e aceitar, com serenidade, o que está fora dele. É uma filosofia prática, centrada no autodomínio, na razão e na busca de sentido.
Sêneca, por exemplo, dizia: “Grande parte da dor está na antecipação”. E como isso é verdadeiro! A mente, dominada pela ansiedade, antecipa cenários negativos, gera sofrimento antes mesmo que os fatos se concretizem, e, na maioria das vezes, eles nem chegam a acontecer.
A boa nova é que não estamos presos a esse ciclo, esse padrão pode ser ressignificado. Em processos de coaching e de terapia, perguntas simples, mas poderosas, ajudam a romper com essa prisão mental:
- Isso vai importar daqui a um mês?
- Isso terá impacto real na minha vida daqui a um ano?
- Isso é urgente ou só está gritando mais alto do que o necessário?
- O que, de fato, está sob meu controle agora?
Esses questionamentos nos levam de volta ao eixo. Impedem que emoções momentâneas comandem decisões equivocadas. Quantas vezes já nos arrependemos por termos tomado decisões impulsivas, influenciadas por dores do agora que, com o tempo, se mostraram pequenas?
A capacidade de dar proporção aos acontecimentos é uma habilidade emocional. E como toda habilidade, pode ser treinada. Uma forma prática é cultivar o hábito de fazer pausas antes de reagir. Respirar. Refletir. Escrever. Visualizar o futuro e imaginar como olharemos para essa situação com distância emocional. Será que ela parecerá tão grande quanto agora?
Outro exercício interessante é o do “eu futuro”: imagine-se daqui a cinco anos, olhando para a sua vida atual. O que essa versão mais madura diria sobre suas preocupações de hoje? O que recomendaria manter, soltar ou transformar?
A maturidade emocional está, muitas vezes, na capacidade de escolher as batalhas certas, dar a devida importância às situações e preservar a energia vital para o que realmente importa.
Não se trata de ignorar emoções, mas de reconhecê-las sem ser dominado por elas. De ser autor da própria história e não refém dos próprios pensamentos. É importante lembrar: sou o ser que pensa, não o pensamento.
Quando desenvolvemos esse olhar mais amplo, ganhamos não apenas equilíbrio, mas também leveza. Descobrimos que não precisamos carregar o mundo nos ombros, que é possível escolher o que nos atinge internamente, e como nos posicionamos diante da vida.
Nem tudo é tão urgente quanto parece. Nem tudo merece a nossa paz.
As opiniões expressas neste texto são de responsabilidade exclusiva do(a) autor(a) e não refletem, necessariamente, o posicionamento e a visão do Estado de Minas sobre o tema.