Decreto "destrava" a agricultura irrigada em Minas. Entenda
Legislação publicada no ano passado recebe validação para que a prática mecanizada seja classificada como uma atividade de utilidade pública
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Siga noA lei que trata da Política Estadual de Agricultura Irrigada Sustentável (Lei Estadual 24.931/2024) foi publicada há quase um ano, mas só foi “destravada” agora, a partir de um decreto do governo de Minas Gerais. De acordo com Ariel Chaves, chefe do Núcleo de Gestão Ambiental da Secretaria de Estado de Agricultura, Agropecuária e Abastecimento (Seapa), o decreto foi necessário para validar os papéis e obrigações assumidos pelo estado dentro dessa política.
Na prática, a lei permite que a agricultura irrigada seja classificada como uma atividade de utilidade pública. “Mas, isso só é feito a partir de um processo administrativo. O decreto traz todas as bases para esse procedimento, quais os documentos e estudos são necessários e qual o tempo de análise. Ele traz segurança jurídica tanto para o produtor, que sabe exatamente a documentação que vai precisar apresentar, quanto para o analista, que terá as diretrizes que a lei e o decreto colocou”, explica Ariel.
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Guilherme Oliveira, analista de sustentabilidade da Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de Minas Gerais (Faemg), entidade que representa os produtores rurais, conta como tem sido essa questão antes desse decreto: “Mesmo que você tenha autorização, na hora de construir o barramento, o Instituto Estadual de Floresta (IEF) não permite porque as margens de rio são consideradas Áreas de Preservação Permanente (APPs), onde você só pode mexer nos casos de utilidade pública, interesse social ou de baixo impacto. A agricultura não se enquadrava nisso”.
De acordo com a chefe do Núcleo de Gestão Ambiental da Seapa, o decreto estadual foi feito em parceria com a Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável de Minas Gerais (Semad). “Isso também traz segurança jurídica tanto para os técnicos da Seapa, que vão analisar o pedido da declaração de utilidade pública, quanto para os técnicos da Semad, que vão analisar um eventual pedido de intervenção ou de outorga”, analisa Ariel.
Exigências ambientais
Ela garante que, para construir um barramento, todos os atos autorizativos dos órgãos ambientais continuam sendo necessários. Se, eventualmente, for necessário fazer uma intervenção ou uma supressão de árvores, será preciso apresentar um pedido no IEF. “Abriu-se a possibilidade, mas tem uma esfera de compensações e normatização que o produtor tem que continuar seguindo, porque a política florestal e de recursos hídricos é muito rígida no estado”, concordou o analista de sustentabilidade da Faemg.
Oliveira explica que, para solicitar a construção de um barramento, o produtor tem que fazer um estudo ambiental, chamado Zoneamento Ambiental e Produtivo (ZAP), que vai fazer todo o levantamento da bacia hidrográfica para determinar a melhor área para construir o barramento, assim como as compensações para a área desmatada.
“Além de priorizar a irrigação, essa política a todo momento fala da sustentabilidade, que são os processos que vão garantir que, desde o armazenamento da água até a hora que essa água cai no solo, tudo seja feito de forma adequada, utilizando as mais modernas técnicas agrícolas para evitar o desperdício e que essa água cause erosão”, afirmou.
Vantagens
O analista de sustentabilidade da Faemg explica que a agricultura irrigada está inserida no plano de agricultura de baixo carbono. Ela é uma técnica em que mantém a área produtiva durante todo ano. “Sem a irrigação, por exemplo, você planta soja no período de chuva, você ainda consegue plantar um milho na safrinha e depois não tem mais chuva. Aí, você não planta mais. Quando você tem irrigação, você tem o controle da água na sua cultura e mantém a área produtiva durante todo ano. As áreas irrigadas podem produzir, em alguns casos, até três vezes mais do que uma área convencional. Então você tem um ganho de produtividade. É o que a gente chama de ‘efeito poupa terra’, porque não precisa mais abrir área de mata para plantar”, resume.
De acordo com Oliveira, o Brasil ainda irriga muito pouco, somando cerca de 8 milhões de hectares irrigados, enquanto esse potencial é de 55 milhões de hectares de área produtiva, já descontando as áreas de reserva legal, de APP, unidade de conservação e de relevo ruim. Minas Gerais é o estado com a segunda maior área irrigada do país, com 1,12 milhão de hectares, que corresponde a 15% da área produtiva do estado. Mas, seu potencial é de irrigar mais de 3 milhões de hectares.
"Isso também traz segurança jurídica tanto para os técnicos da Seapa, que vão analisar o pedido da declaração de utilidade pública"
Ariel Chaves, chefe do Núcleo de Gestão Ambiental da Secretaria de Estado de Agricultura
O analista da Faemg confirma que, geralmente, barramentos são obras caras, que demandam muita movimentação de terra, mas não são um caro impeditivo. “Compensa, porque, no final, você tendo essa garantia da água, você está garantindo a sua produção”, disse Oliveira. Mas, para além do grande produtor, capaz de fazer grandes investimentos, “a lei de irrigação sustentável também prevê a instalação de barraginhas e poços artesianos como formas alternativas de captação e de reserva de água”, garante Ariel.
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A chefe do Núcleo de Gestão Ambiental da Seapa acredita que os produtores do semiárido devem ser os que mais vão se beneficiar com a política de agricultura irrigada: “A intenção é trazer segurança hídrica para o produtor do semiárido. Claro que os produtores de outras regiões do estado também vão ser beneficiados, mas, a ‘menina dos nossos olhos’, digamos assim, é o produtor rural do semiárido mineiro”.